segunda-feira, 20 de março de 2023

Levado à loucura

A hora das bruxas já havia passado, mas uma sensação estranha persistia, deslizando pela noite como uma serpente venenosa à espreita. A escuridão engoliu a paisagem, deixando apenas o brilho impiedoso dos meus faróis para perfurar o vazio. Minhas mãos, com os nós dos dedos brancos, agarraram-se ao volante como um homem se afogando em uma bóia salva-vidas.

A exaustão e a privação de sono corroeram minha noção de tempo e lugar. Eu estava sozinho nessa estrada aparentemente infinita, a estrada uma serpente de asfalto que deslizava impiedosamente pela paisagem desolada. Minha única companhia era o rádio, seus DJs e jingles noturnos fornecendo um vínculo tênue com a sanidade em meio à loucura crescente.

À medida que os marcadores de milha se misturavam, a mesmice das árvores retorcidas e dos outdoors repetitivos me provocavam. Era como se eu estivesse preso em um loop macabro, as fronteiras entre passado, presente e futuro se dissolvendo em um miasma indistinguível de terror.

Então, sem aviso, uma figura emergiu da mortalha de escuridão. A princípio, parecia uma ilusão de ótica conjurada pelo meu cérebro fatigado. Mas quando me aproximei, vi um homem — ou algo que já havia sido um homem — parado no meio da estrada. Suas feições, distorcidas pelo brilho doentio dos meus faróis, estavam distorcidas em uma grotesca caricatura da humanidade.

Ele usava um terno esfarrapado e uma gravata frouxa envolvia seu pescoço como um laço de carrasco. Seus olhos, fundos e ocos, penetravam em mim com uma maldade que ameaçava congelar meu sangue. Esse espectro era um prenúncio da desgraça, um mensageiro das profundezas do inferno, e fui dominado por uma compreensão instintiva de que golpeá-lo selaria meu próprio destino.

Quando desviei para fugir do fantasma, o volante se contorceu sob minhas mãos como uma coisa viva. O carro saiu da estrada, o mundo girando no caos enquanto eu me inclinava em direção ao abismo escancarado do abismo. Naquele momento, uma risada maníaca e gutural reverberou pela noite, abafando a cacofonia de metal triturado e vidro estilhaçado.

Quando acordei, fui recebido pela fluorescência estéril de um quarto de hospital. Meus membros estavam envoltos em gesso, e o bipe rítmico das máquinas criava uma sinfonia dissonante que zombava do meu estado fraturado. Uma médica, com o rosto marcado por uma mistura de simpatia e perplexidade, explicou que eu havia sobrevivido milagrosamente ao acidente.

Enquanto eu estava lá, quebrado e desnorteado, a lembrança da figura sinistra assombrava meus pensamentos. Ele era uma mera invenção da minha imaginação, um produto da minha sanidade desvendada? Ou eu realmente encontrei alguma força malévola naquela estrada desolada? Perguntas giravam em minha mente como abutres cercando suas presas, mas nenhuma resposta veio.

Nos dias que se seguiram, lutei com a natureza enigmática do espectro, procurando um significado nas sombras. Eu vasculhei lendas locais e contos sussurrados, procurando qualquer dica que pudesse iluminar a verdade. O que descobri apenas aprofundou o mistério - um punhado de encontros semelhantes, cada um uma peça enigmática do quebra-cabeça sugerindo um padrão maior e mais sinistro.

E enquanto olhava para o teto branco estéril, não pude deixar de sentir que o acerto de contas estava apenas começando. Minha obsessão com o passageiro fantasma me consumiu, e jurei desvendar os segredos sombrios que espreitam sob a superfície. Pois naquela hora assustadora na estrada, eu vislumbrei o abismo, e ele deixou uma marca elegível em minha alma.

À medida que as semanas se transformaram em meses, tornei-me uma sombra do meu antigo eu. A busca para descobrir a verdade por trás do passageiro fantasma consumiu cada momento acordado, levando-me à beira da insanidade. Minha vida antes organizada havia se transformado em um redemoinho caótico de pesquisas, entrevistas e vigílias noturnas naquele trecho fatídico da rodovia.

Minha busca incansável por respostas começou a produzir descobertas assustadoras. O passageiro fantasma não era uma anomalia isolada; outros também o encontraram, cada encontro com um encontro semelhante com a morte. Mas o verdadeiro propósito do espectro permanecia irritantemente evasivo, um enigma tentador que se recusava a ser desvendado.

À medida que o aniversário de um ano do meu encontro se aproximava, mais uma vez me vi dirigindo pela estrada deserta às 4 da manhã. A noite estava opressivamente escura, o ar espesso com uma energia malévola que parecia arranhar o próprio tecido da realidade. Meu coração disparou e minhas mãos tremeram no volante enquanto me aventurava mais fundo no abismo.

E então, como se convocado por meus próprios pensamentos, o passageiro fantasma apareceu diante de mim mais uma vez. Mas desta vez, eu estava preparado. Enfrentei a aparição, exigindo respostas para as perguntas que há tanto tempo me atormentavam.

Para minha surpresa, o espectro falou. Sua voz era um sussurro gutural, como o som de folhas secas farfalhando em um vento frio de outono. Ele revelou ser uma alma amaldiçoada, condenada a vagar pela estrada por toda a eternidade, com o propósito de servir como um lembrete sombrio da linha tênue entre a vida e a morte.

Naquele momento, eu entendi. Minha obsessão com o passageiro fantasma não foi uma descida à loucura, mas uma jornada de autodescoberta. Eu recebi uma segunda chance na vida, e a presença assombrosa do espectro era um lembrete constante para abraçar a natureza fugaz da existência.

Com clareza recém-descoberta, dei adeus ao passageiro fantasma e me afastei da escuridão que ameaçava me consumir. E quando a primeira luz do amanhecer apareceu no horizonte, senti uma sensação de paz tomar conta de mim, sabendo que havia enfrentado meu próprio julgamento e saído vitorioso.

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