segunda-feira, 13 de março de 2023

Lembrar

Não me lembro quando começou. Era como uma coisa lenta e rastejante, algo que deslizou para dentro da minha vida e se apoderou de mim. No começo, eram apenas pequenas coisas. Eu esqueceria onde coloquei minhas chaves ou o nome de alguém que acabara de conhecer. Mas então começou a escalar.

Era como se eu estivesse vivendo em uma névoa, tudo embaçado e indistinto. Eu olhava para minhas mãos e elas me pareciam estranhas, como se eu as estivesse vendo pela primeira vez. Às vezes, quando me olhava no espelho, não reconhecia o rosto que me encarava.

Era como se eu estivesse desaparecendo.

E então, um dia, acordei em uma cama de hospital. Eu não sabia como cheguei lá, ou o que tinha acontecido comigo. Os médicos me disseram que eu havia sofrido um acidente de carro, que havia sofrido um traumatismo craniano. Mas não parecia certo. Era como se eles estivessem escondendo algo de mim, algo que estava fora de alcance.

Tive alta do hospital alguns dias depois, mas as coisas não melhoraram. Se alguma coisa, eles pioraram. Eu acordava no meio da noite, gritando, com o coração batendo forte no peito. Eu não conseguia me livrar da sensação de que algo estava me observando, esperando que eu baixasse a guarda.

E então, um dia, eu o vi.

Era como uma sombra, uma coisa informe que se movia no canto do meu olho. A princípio, pensei que fosse apenas minha imaginação, um produto do meu cérebro danificado. Mas então começou a tomar forma.

Era como uma pessoa, mas não exatamente. Seus membros eram muito longos, seus dedos muito afiados. Não tinha rosto, apenas uma boca aberta que parecia se estender para sempre. E estava sempre me observando, sempre esperando.

Tentei contar às pessoas sobre isso, mas ninguém acreditou em mim. Eles pensaram que eu estava tendo alucinações, que ainda estava sofrendo os efeitos do meu ferimento na cabeça. Mas eu sabia que era real. Eu podia sentir isso em meus ossos.

Começou a me seguir, onde quer que eu fosse. Era como uma sombra, sempre à espreita fora de vista. Eu o vislumbrava em reflexos ou o via disparando pelas esquinas. E cada vez que o via, sentia um frio e um medo doentio na boca do estômago.

Comecei a me afastar do mundo, ficando dentro do meu apartamento por dias seguidos. Parei de atender meu telefone, parei de ver meus amigos. A única coisa que importava era a sombra e a sensação terrível e assustadora que ela me dava.

E então, uma noite, acordei e o encontrei parado ao pé da minha cama.

Eu podia sentir sua respiração em meu rosto, quente e pútrida. Seus olhos estavam fixos nos meus, e eu podia sentir o peso de seu olhar como uma coisa física. E então falou, sua voz um rosnado baixo e estrondoso.

"Lembrar."

E então ele se foi.

Eu não sei o que isso significa. Não sei o que ele quer de mim. Tudo o que sei é que está sempre lá, observando, esperando. E tenho medo de que um dia isso me consuma completamente.

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