Ultimamente, as coisas começaram a parecer estranhas, sutilmente a princípio, e depois de uma vez, como se a própria realidade tivesse se deslocado ligeiramente para a esquerda. Começou com as mensagens. Comecei a receber mensagens de um número desconhecido, cada uma simples, quase inofensiva: "Você teve um bom dia hoje?" ou "Espero que esteja cuidando de si mesmo." Eu perguntava quem era, mas a única resposta sempre era: "Alguém que se importa."
Tentei ignorar, atribuir a um número errado ou talvez uma tentativa equivocada de conexão na era digital. No entanto, conforme os dias passavam, as mensagens se tornavam mais pessoais, mais inquietantes. "Notei que você parecia cansado hoje", dizia uma, em um dia em que mal consegui passar pela minha rotina, o peso da existência mais pesado que o normal.
Foi por volta desse tempo que comecei a notá-lo - o homem do casaco cinza. Eu o via em todos os lugares: no supermercado, em minhas caminhadas noturnas, do lado de fora do meu prédio. Sempre à distância, sempre observando. Nas primeiras vezes, convenci-me de que era coincidência. Afinal, em uma cidade com milhões de pessoas, os caminhos estão destinados a se cruzar. Mas então, as mensagens começaram a mencioná-lo. "Você viu o homem do casaco cinza hoje? Ele está te observando."
Minhas tentativas de confrontá-lo foram inúteis. Sempre que eu tentava me aproximar, ele se misturava à multidão, desaparecendo como se nunca estivesse lá. Meus amigos diziam que eu estava pensando demais, que o estresse da vida na cidade estava me afetando. Eu queria acreditar neles, mas o nó no meu estômago, o sentimento de medo que se agarrava a cada passo, contava uma história diferente.
Uma noite, incapaz de dormir, decidi sair para uma caminhada. A cidade à noite é uma fera diferente, viva de uma maneira que parece tanto excitante quanto ameaçadora. As ruas estavam estranhamente vazias, os habituais notívagos haviam se recolhido às suas casas. Foi durante essa caminhada que encontrei - um envelope pequeno e discreto no chão, meu nome escrito nele em letras cursivas e limpas.
Dentro havia uma única fotografia, uma imagem minha, tirada de longe. No verso, uma mensagem: "Você nunca está sozinho." Meu coração disparou enquanto olhava ao redor, meio esperando ver o homem do casaco cinza se esgueirando nas sombras. Mas não havia nada, apenas a cidade silenciosa e vigilante.
Relatei tudo à polícia no dia seguinte, mas sem evidências concretas, pouco puderam fazer. Eles sugeriram mudar meu número, talvez mudar para um novo apartamento. Conselhos práticos, mas nada fizeram para acalmar o crescente medo dentro de mim.
Então chegou a noite que mudou tudo. Acordei com o som do meu telefone vibrando implacavelmente na mesa de cabeceira. Sonolento, estendi a mão para pegá-lo, a tela iluminando para revelar mensagem após mensagem do número desconhecido, cada uma mais frenética que a anterior. "Ele está vindo atrás de você", dizia uma. "Você precisa sair, agora."
O pânico se instalou, um terror visceral e avassalador que me impulsionou para fora da cama em direção à porta. E foi então que vi, uma sombra desprendida da escuridão, o contorno de um homem parado no canto do meu quarto. O homem do casaco cinza. Mas, conforme meus olhos se ajustavam, percebi que não era um homem afinal, mas sim um casaco pendurado em um suporte, sua forma distorcida pela minha mente atormentada pelo medo.
As mensagens pararam depois dessa noite. Nunca mais vi o homem do casaco cinza, nem recebi mais envelopes. Algumas noites, me convenço de que tudo foi produto da minha imaginação, um pesadelo vívido trazido à vida pelo estresse e pela solidão da vida na cidade. Em outras noites, não tenho tanta certeza.
Desde então, mudei para um novo apartamento, troquei meu número, tentei reconstruir a semelhança de uma vida normal. No entanto, o medo persiste, um fio se desenrolando no tecido da minha realidade. Cada número desconhecido, cada estranho de passagem com um casaco cinza, me envia um choque de medo, um lembrete do tempo em que os limites entre o real e o imaginado se fundiram em um só.
Às vezes, tarde da noite, me pego pensando sobre a natureza da nossa existência, sobre as forças invisíveis que moldam nossas vidas de maneiras que talvez nunca compreenderemos. Foi um aviso, um anjo da guarda disfarçado de perseguidor, ou algo muito mais sinistro? A verdade continua elusiva, escondida nas sombras de um mundo que parece ligeiramente fora de equilíbrio.
E assim, escrevo esta história, uma espécie de confissão, na esperança de que alguém lá fora possa lê-la e entender. Ou talvez, para me tranquilizar de que não estou sozinho ao sentir que, às vezes, a realidade não passa de uma fina camada, facilmente despedaçada pelas coisas que não podemos - ou não queremos - ver.
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