A voz escapou da escuridão do meu quarto. Fiquei paralisado, a adrenalina percorreu meu corpo, meus olhos antes pesados estavam bem abertos. Observei a escuridão ao redor do meu quarto. Esperando encontrar alguma explicação racional para o que tinha acabado de falar comigo. Enchimento estava espalhado pelo quarto. Meu ursinho de pelúcia havia sido rasgado e suas entranhas espalhadas pelo chão. Eu sentia cheiro de cabelo queimado e ouvia um ruído crepitante rítmico. Ouvi um barulho vindo do meu armário, seguido de um leve baque.
"Alô?" Perguntei. Chamando pateticamente pela escuridão. Rezando para que nada respondesse. Que minha imaginação tivesse apenas se descontrolado.
"Sou eu." A voz sussurrou em resposta ao meu chamado. Fiquei paralisado. A voz era rouca, mas ainda aguda. Ouvi movimento dentro do armário e conforme meus olhos se ajustaram, notei uma mão branca pálida alcançar a porta do meu armário. Ele não tinha unhas. Quando a porta se abriu e as persianas abertas das minhas cortinas deixaram o luar entrar, pude distinguir a figura. Agachada no meu armário, me observando.
"Você vai me machucar?" Sussurrei. Pude vê-lo limpando o queixo. Ele vestia um moletom branco manchado. Eu podia ver a escuridão de seus olhos. Seu reflexo ao luar.
"Não tenha medo." Sua respiração crepitou. Soava como galhos queimando no fogo. Ele ofegou e ouvi uma leve tosse. Seus pés descalços estavam apoiados no carpete. "Eu não sou o bicho-papão. Eu conheci o bicho-papão."
"Você promete?" Perguntei a ele. Ele parecia frio, mas havia uma energia emanando dele. Algo excitado. Ele me lembrava meu irmão.
"Aquele ursinho não falava, falava?" Ele me perguntou. Apontou para o enchimento espalhado pelo chão. Sua mão pálida mais uma vez banhada pelo luar. Ele se escondia nas sombras, mas eu podia distinguir formas. Uma estrutura magra.
"O que aconteceu com seus dedos?" Não consegui esconder o tremor na minha voz. Ele olhou para seus dedos. Examinou-os por um momento antes de dar risadinhas.
"Minha mãe vadia arrancou eles." Ele foi atingido pela luz da lua quando se inclinou um pouco para frente da porta do meu armário. Ele recuou. Levantando a perna e se puxando de volta para a escuridão do meu armário. Ele era pequeno e magro. Sua boca deixou uma gota de sangue ao se afastar.
"Você está me assustando." Eu queria chorar. Queria puxar o lençol sobre minha cabeça e me esconder.
"Ah, qual é. Eu não sou tão assustador assim. Eu poderia estar pelado rastejando embaixo da sua cama. Não cortando minhas malditas unhas." Ele riu novamente antes de tossir. "Quer ouvir uma piada?"
"Ok." Assenti. Ele esfregou as mãos antes de rir baixinho consigo mesmo.
"O que você tem quando coloca um bebê nos trilhos do trem?" Ele espiou da escuridão por um segundo. Me encarando. Eu podia ver seu rosto. O que restava dele pelo menos. Ele era branco pálido, sem nariz. Seus olhos pareciam estar afundando. Os círculos escuros ao redor de seus olhos pareciam mais a lenta decomposição de seu rosto do que a reação do corpo à falta de sono. Sua boca tinha grandes cortes nas laterais. Os entalhes moldados em um sorriso que desaparecia atrás de um cabelo preto, longo e fino. Notei um pouco de baba vazar do meio de seu lábio inferior e se esticar lentamente até o chão.
"O quê?" Meu lábio tremeu por um segundo.
"Metade de um maldito bebê morto." Ele riu e se jogou para trás. Senti um nó se formar na minha garganta.
"Mãe!" Gritei e ele se lançou sobre mim do armário. Ele subiu rapidamente na minha cama. Movendo-se como um inseto. Jogou sua mão sobre minha boca. Pude sentir o gosto de produtos químicos, sua leve ardência na ponta da minha língua.
"Se você gritar por aquela vadia de novo, vou cortar sua maldita garganta." Seus olhos estavam mortos. Uma gota de sangue caiu dos cortes em suas bochechas e pingou no meu pescoço. Ele tirou a mão da minha boca. "Sou eu. É o Jeff. Somos amigos. Eu conheço você. Você está me intimidando. Por que você está me intimidando!?"
"Eu não estou te intimidando. Não sei quem você é." Chorei. Uma lágrima rolou pelo meu rosto. Jeff segurou o rosto nas mãos e soluçou.
"Eu odeio valentões." Jeff parou de soluçar de repente e olhou para mim. "Eu os odeio."
"Me desculpe." Eu disse. Jeff se inclinou para trás e se acomodou no canto da minha cama. Agora eu podia vê-lo completamente. Ele usava calças pretas compridas, seus pés descalços estavam manchados e ele era pequeno. Não maior que meu irmão mais velho. Ele vestia um moletom branco e notei sangue se acumulando em seus pulsos. Permitindo que gotas atravessassem o tecido e escorressem por suas pontas dos dedos. Ele levantou os joelhos até o peito. Dos bolsos de sua calça algo caiu. Jeff percebeu e pegou um dedo decepado do lençol.
"Como isso foi parar aí?" Jeff riu antes de jogá-lo por cima do ombro. Voltou sua atenção para mim. Ele babou por um momento, lambuzando seu queixo antes de limpar com a manga. Levantou as mãos e as passou pelo cabelo preto fino e comprido no topo de sua cabeça. Estalava conforme ele tocava. Partes dele se quebrando sobre seus dedos.
"O que você quer?" Perguntei a Jeff. Seu rosto estava morto, frio e sem vida. Ele começou a sorrir e puxou uma faca da manga de seu moletom.
"Só conversar." Jeff enrolou a manga e levantou a faca antes de cortar a lateral de seu braço. Sangue jorrou dele e ele ficou olhando, sorrindo, enquanto escorria pelo seu braço.
"O que há de errado com você?" Sussurrei. Jeff parou quando eu disse isso. Seu rosto mudou e ele me olhou direto nos olhos.
"Qual é seu nome?" Ele me perguntou antes de levantar a faca e passar a língua pela lâmina. Eu queria vomitar. Queria mentir. Dizer algo diferente.
"É Ben." Respondi, baixinho.
"Não é não. Ben era aquele gordo que se afogou." Jeff riu. "É Louis. Lou. Tanto faz. Eu conheci um Lou uma vez. Ele era meu irmão. Acho que era meu irmão. Talvez fosse eu. Ele foi mandado para a prisão quando tinha onze anos. Eles apareceram e o levaram embora. Pode acreditar nisso?"
"Não é assim que a prisão funciona..." Parei de falar quando ele me encarou.
"Foi assim que funcionou para mim. Meu eu maior me defendeu." Jeff inclinou a cabeça. Sua língua tinha se partido quando ele a lambeu, mas agora estava bem. Aparentemente curada. "Meu irmão foi esfaqueado e derramaram vodka nele e o incendiaram. Os valentões. Um baixo e gordo. Um alto e magro. Um... tipo... nenhum desses, eu acho. Bem variado." Jeff se inclinou ao lado da minha cama e olhou embaixo dela antes de voltar.
"Você é Jeff the Killer." Murmurei para ele e ele sorriu novamente. Uma poça de sangue se formou sob seu moletom e manchou seu capuz. O sangue vindo do nada.
"Talvez." Jeff sorriu. "Meio que queria que tivessem pensado em um nome melhor. Mr Widemouth já estava ocupado." Jeff levou as mãos aos cortes nas bochechas e enfiou os dedos dentro deles. Puxou-os rasgando um corte mais profundo em suas bochechas. Rasgando-as até as orelhas.
"Você vai me matar?" Perguntei já sabendo a resposta.
"Sim." Ele me encarou sem expressão. Sangue escorrendo pelo pescoço. Ele nem tentou esconder. Sabia que eu estava assustado demais para fazer qualquer coisa. Ainda achei que talvez pudesse convencê-lo. Ainda achei que talvez pudesse viver.
"Por quê? O que eu fiz de errado?" Chorei.
"Você deixou sua janela aberta." Jeff deu de ombros. Ele parecia ter perdido o interesse. Olhou ao redor do quarto. Olhou para suas mãos e as espalhou na sua frente. Inclinou a cabeça e olhou para seu dedo mindinho esquerdo. Agarrou-o com a mão direita antes de quebrá-lo. Examinou seu dedo mutilado e sorriu. "O homem alto me deixa fazer o que eu quero. Uma mulher comeu um maldito gato! Pode acreditar nisso?"
"Não." Puxei o lençol até meus olhos enquanto o observava. Ele se inclinou um pouco. Seu rosto era tão estranho. Tão quebrado. Mal dava para dizer que era humano.
"Quantos anos você tem?" Jeff inclinou a cabeça para mim enquanto levantava a faca. "Não minta para mim, Louie. Eu sei a resposta."
"Tenho nove." Sussurrei. Jeff sorriu e rastejou até mim. Ele tinha sua faca próxima ao meu rosto e eu podia ouvir tudo, ver tudo, sentir o cheiro de tudo, sentir tudo. O sangue que aleatoriamente se acumulava e desaparecia sobre suas roupas. O ardor dos produtos químicos emanando dele no ar. A palidez de sua pele. O vazio de seus olhos. A falta de pálpebras. Os entalhes em suas bochechas. O cheiro de cabelo queimado. O som de sua respiração. Tão forçada, tão fraca. Mas acima de tudo, era sua forma. Seus movimentos. Como uma aranha.
"Vá dormir." Ele sussurrou para mim antes de passar a lâmina pela minha garganta. Acordei novamente na floresta. Cercado por uma névoa. Tudo parecia diferente. Parecia estranho. Surreal. Fiquei de pé. Agarrei meu pescoço apenas para minha mão atravessar o corte. Olhei para meu corpo e pude ver que meu pijama xadrez tinha sido rasgado em pedaços e eu estava coberto de facadas. Corri passando por uma árvore com um papel preso nela. Continuei correndo passando por aquela árvore uma quantidade infinita de vezes. Olhei para baixo e pude ver minhas pegadas. Me cercando. A lama sendo levantada conforme meus pés pisoteavam o mesmo quadrado. A névoa tão próxima do meu rosto que mal conseguia distinguir qualquer coisa ao meu redor. Virei e corri na direção oposta. Passando pela árvore novamente. E novamente. E novamente. E novamente. Parei e senti um zumbido nos ouvidos. Eu estava preso em algum tipo de floresta sem fim. Desabei o zumbido estava distorcendo. Meus pensamentos dominados. Uma dor através da minha mente. Um estalo de uma psique. Uma dor que nunca senti. Olhei para cima conforme a névoa escurecia. Uma névoa profundamente negra me cercou. Meu nariz começou a sangrar. Seguido pelos meus ouvidos. Depois meus olhos. Deitei no chão e gritei de dor implorando para que parasse. Abri os olhos e limpei o sangue deles. Então eu o vi. Foi quando vi o bicho-papão.
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