Esfreguei meu joelho com uma careta, a dor uma lembrança constante de tudo que havia dado errado. Era mais do que apenas dor física - era um lembrete diário do meu maior arrependimento. O acidente de carro que tirou Sarah de mim também roubou meu senso de propósito. A fazenda, antes viva e próspera, havia murchado após sua morte e eu também. As plantações estavam falhando, a casa estava desmoronando e as contas se acumulando.
Dei um longo gole do copo em minha mão, o álcool queimando minha garganta. Eu havia perdido a conta de quantas bebidas tinha tomado naquela noite. Provavelmente cinco, talvez seis. Era difícil manter o controle hoje em dia. Costumava pensar que isso amortecia a dor, mas naquela noite só estava intensificando-a, me fazendo mais consciente de quanto eu havia caído. Sentei ali, olhando para os campos, sabendo que em breve pertenceriam a outra pessoa. Assim como todo o resto. Minha vida inteira estava desmoronando, e eu estava bêbado demais para me importar.
Sarah tinha sido minha âncora. Ela me mantinha com os pés no chão, mantinha a fazenda funcionando. Sem ela, eu não tinha nada. A casa estava vazia agora, exceto pelos fantasmas das memórias que eu não conseguia afastar. Sua risada. O jeito que ela me repreendia por beber demais. O jeito que ela sempre me lembrava de cuidar das coisas. Agora, tudo estava em ruínas, e tudo que me restava era esta varanda, esta garrafa de uísque e a dor no meu joelho.
Olhei através do campo para onde o espantalho estava, uma figura grotesca parada no crepúsculo. Estava lá há anos, um velho boneco de palha vestido com roupas esfarrapadas. Uma vez, tinha servido a um propósito - proteger as plantações dos pássaros. Mas agora, era apenas uma figura oca e em decomposição, como todo o resto.
Tinha se tornado uma espécie estranha de companheiro ao longo dos anos. Às vezes, depois de muitas bebidas, eu me pegava conversando com ele, desabafando sobre coisas que não podia dizer a mais ninguém. Eu contava meus arrependimentos, meus medos, e imaginava que ele entendia. Mas naquela noite, havia algo diferente nele. Parecia... mais próximo, de alguma forma.
"Ainda montando guarda, hein?" murmurei, minha voz espessa com o ardor do álcool e amargura. "Como se você tivesse algo para proteger ainda."
Eu ri, mas o som parecia errado, vazio. O olhar do espantalho parecia mais intenso, mais focado que o normal. Por um momento, quase pensei que ele se moveu. Pisquei, limpando a névoa da minha mente, e olhei novamente. Ele ainda estava lá, imóvel, como esteve por anos. Mas agora, algo nele fazia os pelos da minha nuca se arrepiarem.
Meu joelho ardeu novamente, enviando uma onda de dor através da minha perna. Era como um relógio. Toda noite, exatamente às 5:45 da tarde, a dor me atingia, feroz e implacável. No início, eu desmaiava com a intensidade. Mas agora, estava acostumado. Me preparei, sabendo que estava chegando.
Fechei os olhos, apertando os braços da cadeira como se estivesse preso em uma cadeira elétrica. A dor atingiu, como sempre fazia. Era como fogo subindo pela minha perna, me dilacerando. Mas desta vez, algo mais veio junto - um flash do rosto dela. Sarah. Seus olhos, arregalados com traição, sua boca se movendo em uma pergunta da qual eu não podia escapar: "Por que você fez isso, Darcey?".
Tentei gritar, pedir perdão, mas as palavras ficaram presas na minha garganta. Pensei sobre o acidente e o fato de que eu estava dirigindo bêbado. O mundo girou, e por um momento, eu estava de volta no carro, assistindo enquanto tudo ao meu redor se despedaçava, seu corpo sendo arremessado do acidente. Eu ainda podia ouvir o ranger do metal, o baque da batida. E então, não o silêncio, mas o som do rádio que continuava tocando funky town como aquele vídeo na internet (se você sabe, você sabe).
Quando a dor finalmente passou, abri os olhos. Eu estava deitado no chão, olhando para o espantalho. E ele estava lá, me encarando como uma sentinela crítica, seus olhos vazios me atravessando. Tentei me levantar, mas minhas pernas estavam fracas, tremendo de dor.
Encarei o espantalho, mal conseguindo ficar em pé. "Que diabos você ainda está fazendo aqui?" cuspi. "Não há nada mais para proteger. Vá embora."
Mas o espantalho não disse nada, como nunca dizia. Ainda assim, não conseguia me livrar da sensação de que algo estava errado naquela noite. Que ele estava diferente, me observando com uma espécie de intenção distorcida.
Cambaleei para longe, voltando para a varanda onde minha garrafa de uísque esperava. A dor no meu joelho pulsou novamente, e me apoiei no corrimão, respirando pesadamente, onde peguei a garrafa e tomei outro gole, esperando que isso afogasse os pensamentos que estavam surgindo.
Havia uma sensação estranha no ar agora. Uma densidade. Parecia que o campo inteiro estava prendendo a respiração, esperando algo acontecer.
Virei para voltar para casa, mas pelo canto do olho, eu vi. O espantalho estava... se movendo. Não, não podia ser. Girei rapidamente, meu coração acelerado. Mas quando me virei, ele ainda estava lá - parado imóvel no campo, como sempre esteve.
Ri nervosamente. Como minha avó costumava dizer, "Você não consegue ver fantasmas porque está olhando forte demais." E talvez ela estivesse certa. Talvez eu estivesse olhando muito fixamente para o espantalho, me convencendo de que ele estava se movendo. Mas mesmo enquanto estava ali, balançando a cabeça, não conseguia me livrar da sensação de que algo estava errado. Que algo - ou alguém - estava me observando.
Tomei outro gole da garrafa, esperando que isso me anestesiasse. Mas o pavor no meu peito só ficava mais pesado. Toda vez que fechava os olhos, via seu rosto novamente - Sarah, me olhando com aquela expressão de nojo. Podia ouvir sua voz, perguntando por quê, repetidamente. E cada vez, a dor no meu joelho queimava, me lembrando do que eu havia perdido.
Enquanto cambaleava de volta para casa, ainda não conseguia me livrar da sensação de que isso não tinha acabado. Que os fantasmas do meu passado - Sarah, a fazenda, a vida que eu havia destruído - não tinham terminado comigo ainda. Eles ainda estavam esperando, ainda observando, e não importava quanto uísque eu bebesse, não conseguia escapar deles.
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