A risada dele era uma melodia que eu não ouvia há anos, reverberando nas árvores como a luz do sol através das folhas. Eu podia sentir o calor do sol no meu rosto, o cócegas da grama cortada entre os dedos dos pés, o som dos tênis minúsculos batendo no chão.
“Papai, você não consegue me pegar!”
E por um momento, eu realmente não conseguia. Meus joelhos estavam fracos—não pela idade, mas pela alegria avassaladora que eu pensei ter perdido para sempre. Eu me joguei de costas na grama, olhando para as nuvens enquanto ele me derrubava, e ri como se nunca tivesse feito nada de errado.
Acho que sussurrei: “Deus, por favor, não deixe isso ser um sonho.”
Mas era.
Então tudo mudou.
Eu estava no altar. Minhas mãos tremiam, mas não de medo—porque ela estava caminhando em minha direção. Minha esposa. Minha luz.
O vestido dela capturava o sol da tarde como fogo na água, e o sorriso dela—Deus, o sorriso dela—poderia ter curado os mortos. Eu me lembro de quão fortemente ela apertou minhas mãos enquanto fazíamos nossos votos, como rimos e choramos ao mesmo tempo.
O mundo desapareceu naquele momento. Era só ela e eu, prometendo para sempre.
E por um momento, nós tivemos isso.
A memória ficou como uma respiração—e então, como um interruptor, se foi.
O quarto do hospital cheirava a desinfetante e nova vida. Eu me lembro do meu coração batendo tão alto que achei que a enfermeira fosse me mandar sentar.
Mas quando minha filha chegou—gritando ao entrar no mundo—eu chorei mais do que jamais havia chorado. Eu não sabia que era possível sentir tanto amor e medo ao mesmo tempo.
Os dedinhos dela, impossivelmente pequenos, se enrolaram nos meus. Eu sussurrei promessas para ela, coisas nas quais eu nem sabia que acreditava ainda.
Minha esposa a segurou, lágrimas escorrendo pelas bochechas, exausta mas radiante. “Nós fizemos isso,” ela sussurrou.
E novamente, eu implorei ao universo para me deixar ficar ali para sempre.
Mas para sempre é curto. Muito curto.
Então—total escuridão.
Isso é, até eu começar a ouvir um som de campainha. Ficou mais alto, transformando-se no som de máquinas enormes se chocando umas contra as outras. Estava quente—insuportavelmente quente. Como estar dentro de uma forja sem saída. De repente, eu estava na rua de algum complexo industrial, sob um céu da cor de sangue seco e ferrugem.
O ar tinha gosto de enxofre e fuligem. Meu rosto queimava como se eu estivesse muito perto de ferro fundido.
O chão cedeu.
Ou mais como se eu estivesse horizontal a ele.
BAQUE.
Eu bati no chão. Concreto. Afiado e manchado.
“Sim, pegamos mais um,” uma voz disse. “Esses tipos sempre parecem... Acho que vamos colocar este no andar inferior. Ele parece gostar de lá embaixo.”
Eu gritei sem pensar, “Vá se ferrar! Saia de cima de mim! Quem é você e para onde diabos pensa que está me levando?!”
Ele riu, inclinou-se para perto. Seu hálito cheirava a óleo queimado.
“Não acho que você esteja em posição de fazer perguntas agora, está? Mas se você precisa saber, meu nome é Barnard. E eu sou o que você chamaria de gerente desta instalação aqui.”
“Instalação?”
“Veja, quando pessoas como você fazem o que fez, eu tenho que colocá-las para trabalhar. Por toda a eternidade. Nesta forja.”
Ele me virou e me puxou para ficar de pé. Foi então que eu vi todo o horror.
Máquinas enormes alinhavam as ruas, algumas como prensas colossais, outras como braços esqueléticos alcançando fornalhas do tamanho de prédios. Pessoas—se é que ainda se podia chamá-las assim—estavam fundidas a elas. Olhos vazios. Seus membros fundidos com metal, algumas com tubos atravessando suas costas, alimentando fumaça negra no céu.
Um homem tinha agulhas no lugar dos dedos—longas, de grau médico, que pingavam fluido derretido em tubos. Ele não piscava. Não gritava.
Então havia as "coisas".
Altas. Alongadas. Sem pele, e onde deveria haver pele, havia bronze manchado e aço queimado. Seus olhos brilhavam como carvões em brasa, e seus movimentos eram abruptos—sacudindo com um chiado metálico como se suas articulações fossem dobradiças rangendo sobre osso. Elas não estavam apenas observando. Estavam gerenciando.
Estavam construindo mais.
Máquinas com costelas.
Barnard abriu uma porta, me empurrou para dentro, e disse, “Quando você lidar com isso, seguiremos em frente.”
Escuridão novamente.
Quando abri os olhos, estava sentado em uma sala de interrogatório. Fria, cinza e muito familiar.
Uma mulher entrou gritando, “Você matou meu filho, seu porco desgraçado!”
Eu era policial novamente. Infiltrado. Profundo em um esquema de drogas. O menino—ele tinha puxado uma faca para mim. Disse que queria tudo o que eu tinha. Eu me senti ameaçado. Eu atirei nele.
Quando o corpo dele caiu no chão, chamei por reforços. Nunca pensei duas vezes.
Até ela entrar.
E me dei conta—eu não apenas me defendi. Eu acabei com uma vida. O bebê dela.
Antes que eu pudesse falar, a porta rangiu. Barnard me puxou para fora.
“Ainda não. Não é hora de aprender lições. Você tem a eternidade para isso.”
“Eu não entendo.”
Barnard riu. “Tudo a seu tempo, meu rapaz.”
Enquanto nos movíamos pela fábrica, eu ouvi. Uma respiração mecânica profunda—como uma máquina lutando por ar. Misturada com bipes de hospital. Então: WHAM. Barnard me chutou por uma escada.
Eu bati no fundo.
Escuridão.
Então: luz. Suave. Familiar.
Minha esposa e eu estávamos na cozinha, dançando ao som de uma música no rádio. Ela estava rindo, descalça, farinha nas bochechas.
Então o rosto dela mudou.
Medo.
Ela disse que alguém estava observando. Ela ouviu vozes. Sombras se moviam nas paredes. Dias depois, eu tive que tomar a decisão de desligar os aparelhos. Ela não estava mais lá—não de maneira que importasse.
Eu desabei. Gritei. Agarrei meu rosto como se pudesse arrancar a tristeza.
Eu só queria voltar.
“Vamos!” A voz de Barnard quebrou o momento.
Eu não me movi.
Ele me chutou nas costelas. “LEVANTE-SE! Você ainda não acabou. Nem sequer chegamos à sua estação.”
“Mais uma parada,” ele disse. “Geralmente quebra a alma.”
Eu gritei, “POR QUE ESTOU AQUI?!”
Barnard parou. “Você não aguentava mais. É por isso que a maioria está aqui. Ou isso... ou você os matou.”
“Eu… os matei?”
Ele abriu a última porta. “Boa sorte.”
Através da fumaça, eu vi uma máquina em chamas. Algo gritava dentro dela. Um coro de metal e agonia.
Então eu estava no carro. Dirigindo. Visão embaçada. Limpadores oscilando. No retrovisor—meus bebês. Meu garoto. Minha menina. Pacíficos. Dormindo.
A mãe deles se foi. Eu estava bebendo. Demais. Minha mãe cuidava deles enquanto eu me afogava nos bares.
Então: luzes.
Pneus cantando.
Metal rasgando metal.
Silêncio.
Acordei. O carro estava 12 metros de distância. Em chamas.
Sem gritos.
Apenas fogo.
Eu caí de joelhos. Gritei. Bati no chão até minhas mãos sangrarem.
Barnard entrou.
“Devolva meus filhos!” Eu rugi.
“Você os tirou,” ele respondeu. “Agora. Hora de começar a trabalhar.”
Chegamos à minha estação.
“Você tem duas opções,” Barnard disse. “Fazer balas... ou implorar ao Cara Lá de Cima.”
“Eu quero vê-lo agora.”
“Não é assim que funciona. Você precisa refletir.”
“Eu não preciso de nada. Eu preciso SAIR.”
Barnard soltou um grito—mil demônios, engrenagens rangendo contra osso, tudo na minha cabeça. A realidade embaçou.
Ele se afastou.
A Coisa atrás dele—meia-máquina, escorrendo lodo orgânico entre suas placas—movia-se como carne através de um triturador.
Barnard se curvou. “Senhor. Ele solicita sua atenção.”
Eu caí de joelhos. “Eu sei que fui egoísta. Vivi para mim mesmo. Mas se você me der uma segunda chance, vou viver para os outros. Vou ajudar famílias. Vou impedir que as pessoas sigam o caminho que eu segui.”
O ser abriu a mandíbula—metal chocalhou. Ele se abaixou, apertou minha cabeça.
Senti meus ossos da mandíbula rangerem e estalarem à medida que se esmagavam juntos, meus dentes se estilhaçando e se espalhando da minha boca como porcelana quebrada. A pressão de seu aperto só aumentou, transformando meu crânio em um torno. Meus olhos inchavam, veias estourando, até serem forçados para fora de suas órbitas com um som repugnante. Eu podia sentir o tecido mole do meu cérebro liquefazer-se, borbulhando dentro do meu crânio como carne em uma panela fervente—então, com um estalo grotesco, tudo foi esmagado.
Eu abri os olhos.
Luzes do hospital.
Eu levantei a mão. Metade do meu rosto—desaparecida.
Mas eu estava vivo.
E não iria desperdiçar isso.
Se você está pensando em acabar com isso—não faça. Você não quer ir para a Avenida Industrial.
Aproveite cada segundo. Pode ser o seu último.
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