Às vezes penso em uma foto que vi quando era criança — uma foto que me aterrorizava. Não consigo mais lembrar exatamente o que havia nela. Mas o medo que despertava em mim era tão real, tão agudo, que mesmo agora, anos depois, um lampejo de inquietação retorna sempre que tento recordá-la. É estranho como algo que você nem consegue imaginar ainda pode assombrá-lo.
Numa tarde chuvosa, visitei meu tio Ryan, que ainda morava sozinho aos 42 anos na mesma casa em que cresceu. O lugar tinha uma quietude de museu, cheio de memórias intocadas. Lembrei-me de ouvir de nossa família sobre como sua namorada adolescente, Elise, se afogou durante uma viagem de verão quando tinham apenas dezessete anos. Ele nunca namorou ninguém seriamente depois disso. Enquanto estávamos sentados em sua sala de estar, bebendo chá sob o suave zumbido de um abajur, avistei um álbum de fotos antigo na prateleira. Um arrepio me percorreu, súbito e inexplicável. Algo sobre o álbum despertou um medo profundo e enterrado — como a sensação que tenho quando tento lembrar daquela foto da minha infância. Não é a namorada do meu tio que estava na foto assustadora, não é? Quero dizer, a namorada dele parecia doce e encantadora.
Quando terminamos nosso chá, o tio se levantou e cortou cuidadosamente uma fatia pequena do bolo de limão que estávamos comendo. Ele a colocou gentilmente em um pequeno prato floral, depois abriu a geladeira e a colocou na prateleira de cima, bem ao lado de um pote de vidro antigo com rosas secas dentro. Eu observei, intrigado. “Guardando um pouco para mais tarde?” perguntei levemente. O tio sorriu, mas não alcançou seus olhos. “É para a Elise,” disse suavemente. “Ela sempre amava bolo de limão. Eu gosto de deixar algo para ela, caso ela visite.” Sua voz não continha ironia, apenas convicção tranquila. Senti um aperto estranho no peito, e aquele medo antigo e esquecido voltou a despertar — como se algo à vista estivesse começando a se aproximar.
Levantei-me e me alonguei. “Posso dar uma olhada por aí? Não vejo a casa há anos,” disse, forçando um tom casual. O tio assentiu, gesticulando vagamente pelo corredor. “Claro. Vá em frente."
Entrei em um dos quartos recém-pintados — um espaço tranquilo e suavemente iluminado com paredes verde-claras e um aroma fresco das tábuas do chão polidas.
Caminhei em direção à janela. Quando olhei para fora, minha respiração ficou presa na garganta. Alguém apareceu rapidamente na minha frente do lado de fora da janela. Sua cabeça inclinou-se ligeiramente, e estava sorrindo. Mas havia algo errado com o sorriso. Era muito amplo, muito fixo, como se não pertencesse a uma pessoa viva. Pisquei, e naquele instante, a figura desapareceu. Afastei-me rapidamente da janela, coração disparado.
O que torna mais perturbador é o fato de eu estar no segundo andar.
Apressei-me de volta à sala de estar, tentando manter minha voz firme. “Tio, acabei de lembrar que eu preciso ir. Perdi totalmente a noção do tempo.”
O tio ergueu os olhos da cadeira, surpreso e um pouco magoado. “Já? Você acabou de chegar. Fique para o jantar, pelo menos. Eu ia fazer o ensopado favorito da Elise.”
Aquele nome novamente. Minha pele arrepiou. “Na próxima, prometo,” disse, pegando minha bolsa e vestindo meu casaco com mãos trêmulas.
Passou-se uma semana, e a imagem da figura sorridente se recusava a sair da minha mente. O sono vinha aos trancos, meus sonhos piscando com rostos meio formados e sussurros encharcados. Eventualmente, cedi à atração do passado e liguei para minha mãe numa noite tranquila.
“Oi,” disse, tentando soar casual. “Você se lembra daquela velha mala marrom? Aquela que tinha as fotos e esboços do tio Ryan?”
Houve uma pausa do outro lado. “Aquela coisa? Está no sótão, acho. Por quê?”
“Eu só... quero olhar uma coisa.” Minha mãe suspirou, um suave farfalhar de preocupação em sua voz. “Aquela mala contém muitas coisas valiosas do seu tio. Apenas manuseie-a com cuidado.” Eu prometi a ela que tomaria cuidado.
Era hora de enfrentar o que quer que estivesse esperando nos cantos escuros da minha memória.
O sótão cheirava a poeira e madeira velha, espesso com o peso dos anos esquecidos. Encontrei a mala marrom escondida atrás de uma pilha de expositores quebrados, baú empoeirado e revistas amareladas e rasgadas. Minhas mãos tremiam ligeiramente enquanto a destrancava, os cliques metálicos ecoando na quietude.
Dentro, o aroma familiar de papel e carvão me cumprimentou. Vasculhei-os lentamente, cautelosamente, até que meus dedos pararam em um pedaço desgastado de cartolina enfiado entre duas páginas de um caderno de esboços.
Lá estava.
A foto.
À primeira vista, parecia inocente — uma velha imagem em preto e branco do quintal do meu tio, tirada de uma janela. Mas à medida que ajustava meus olhos, eu a vi. No canto mais afastado da imagem, meio oculto nas sombras perto da cerca, estava a mesma mulher sorridente que eu vi da janela do quarto de hóspedes. Elise. O grotesco rosto apodrecido e afogado de Elise.
Minha respiração ficou presa, mas não desviei o olhar. Virei a página no caderno de esboços ao lado, e meu coração bateu forte no peito. Era um dos desenhos do tio — linhas ásperas e frenéticas em lápis pesado. Uma mulher com um rosto afogado e afundado. Mas o que me fez ofegar foi o pescoço dela, longo e impossivelmente esticado, subindo ao longo da lateral de uma casa, seu rosto espiando pela janela do segundo andar. Parecendo uma cobra pálida mergulhada em lama preta.
De repente, entendi: o medo que carregava desde a infância não vinha apenas da foto. Era de ver aquele rosto uma vez antes — pela mesma janela quando eu era apenas uma garotinha. Elise estava nos observando.
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