Sou jovem, admito, mas isso nunca apagou o desejo insistente de formar uma família que ecoava sem parar no fundo da minha mente. Então, quando cheguei do trabalho há alguns meses e encontrei um bebê na porta de casa, não fiquei tão assustada quanto deveria. Talvez as coisas pudessem ter sido diferentes se eu tivesse ficado.
Enquanto caminhava do trabalho para casa, o sol quente do verão queimava minhas costas. Eu mal podia esperar para entrar e sentir o ar fresco. Suspirei ao enfiar a chave na fechadura enferrujada e velha do meu prédio.
“Droga”, resmunguei, irritada.
A única coisa que aquela fechadura fazia bem era impedir os moradores de entrar. Minha chave nunca deixava de travar, tornando tudo mais complicado do que precisava ser. Subi os quatro degraus até meu apartamento pisando firme e abri a próxima porta com um empurrão.
De cara, vi o que parecia ser uma caixa de entrega da Amazon esperando por mim.
“Hmm, deve ser para um dos meninos”, falei alto. Os “meninos” eram meu namorado e o irmão dele. Eu sabia que não estava esperando nenhuma encomenda, então eles eram a única explicação lógica. Mas, ao me aproximar, percebi que a caixa estava rasgada. “Não dá pra ter nada de bom por aqui, né? Droga!” exclamei para mim mesma. Claro que alguém tinha mexido na nossa correspondência. Claro!
Fui pegar a caixa com raiva, mas então notei pequenos olhos me encarando de dentro dela. Minha respiração parou, e eu recuei, assustada. Abri bem os olhos e olhei de novo para a caixa. E, como eu suspeitava, havia um bebê ali dentro. Olhinhos castanhos me observavam com curiosidade, segurando o que parecia ser um mordedor.
Confesso que meu primeiro impulso foi sair correndo e chamar a polícia, mas algo naqueles olhinhos me prendeu. Era como se eu estivesse hipnotizada. Antes que pudesse processar o que estava acontecendo, já tinha pegado o bebê e estava sentada no sofá.
Não sei dizer quanto tempo fiquei ali, mas, quando saí daquele transe, já era noite, e a voz do meu namorado me questionava com rispidez.
“… tá me ouvindo?! De quem é esse bebê?” ele disparou.
Olhei para ele, franzindo a testa.
“Por que você tá falando comigo assim?” perguntei.
“Faz uns cinco minutos que te pergunto de quem é esse bebê, e você me ignora toda vez”, ele disse, como se fosse óbvio.
“Ah, eu…”
“Não importa”, ele me interrompeu. “Só responde a pergunta.”
“Não sei ao certo. Ele estava na nossa porta quando cheguei”, murmurei.
“ELE? ELE? Você chega do trabalho às três e meia todo dia. Agora são oito e quarenta e cinco, e você tá chamando o bebê de ‘ele’?”
“Do que você tá falando?” retruquei, na defensiva. “Eu só sentei agora.”
Olhei de novo para o bebê, e, estranhamente, ele ainda estava me encarando.
Ouvi meu namorado bufar. “Tá, sei. Só tô dizendo que já se passaram cinco horas, e você nem sabe se é menino ou menina. Melhor ainda: por que não chamou a polícia?”
Essa era uma boa pergunta. Uma ótima pergunta, aliás. Primeiro, eu nem tinha percebido que estava sentada há tanto tempo. Segundo, algo lá no fundo me dizia que não deveria envolver a polícia.
“Não sei. Talvez a gente deva esperar até amanhã. Foi um dia longo. Acho que o bebê só precisa de comida e uma boa noite de sono.”
Ele me olhou com desconfiança, como se estivesse me chamando de louca sem dizer as palavras.
“Não me parece uma boa ideia”, disse, revirando os olhos.
Abri a boca para discutir, mas ele me cortou com um suspiro longo e pesado.
“Tá, você tá certa. Tô exausto. Exausto demais, e a ideia de lidar com polícia e assistência social hoje à noite é simplesmente pesada demais pra mim”, admitiu. “Mas, mesmo assim, a gente não tem nada aqui pra cuidar de um bebê até amanhã.”
Olhei para ele, percebendo que ele estava completamente certo. Não tínhamos nem um lugar decente para o bebê dormir, muito menos algo para alimentá-lo.
Assenti lentamente, ainda com os olhos fixos no bebê. “Vou… vou dar um jeito”, murmurei.
O bebê não tinha emitido nenhum som desde que o peguei. Sem choro, sem balbucios — apenas aqueles olhos escuros e fixos em mim. Isso deveria ter me incomodado, mas, por algum motivo… não incomodava. Naquela noite, demos um jeito. Encontrei uma camiseta velha para enrolar o bebê e o mantive ao meu lado no sofá. Meu namorado resmungou sobre a situação toda antes de ir para a cama, mas eu fiquei acordada, observando o peito do bebê subir e descer. Em algum momento, devo ter pegado no sono.
Quando acordei, o bebê ainda estava na mesma posição, olhos bem abertos, me encarando. Não era aquele olhar sonolento que bebês costumam ter — não. Era como se ele tivesse ficado acordado a noite toda, esperando.
Os dias se misturaram depois disso. Compramos fórmula, fraldas, um berço. Meu namorado continuava perguntando se devíamos chamar alguém, mas eu sempre arranjava uma desculpa para adiar. “Só até encontrarmos os pais”, eu dizia. “Só até as coisas se acalmarem.” Semanas passaram. Ninguém veio procurá-lo. Foi quando comecei a notar coisas estranhas. O bebê nunca chorava. Nunca. Nem quando estava com fome, nem quando acordava no meio da noite. Ele apenas ficava lá, olhando. Às vezes, eu o encontrava encarando o canto do quarto, os olhos acompanhando algo que não estava lá.
Uma manhã, caminhei pelo apartamento e congelei. Meu namorado tinha sumido — sem bilhete, sem explicação. O bebê estava na cadeirinha, as mãozinhas segurando um relógio do meu namorado. Disse a mim mesma que era coincidência. Pessoas vão embora. Relógios se perdem. Mas então o irmão dele parou de aparecer. Amigos pararam de responder minhas ligações. Meu chefe disse que eu tinha pedido demissão semanas antes, mas eu não me lembrava de ter feito isso.
Éramos só eu e o bebê.
O apartamento ficava mais silencioso a cada dia, como se o mundo lá fora estivesse se afastando cada vez mais. Às vezes, eu acordava e encontrava o bebê de pé no berço — não cambaleando como um bebê normal, mas perfeitamente imóvel, perfeitamente equilibrado, com os olhos cravados em mim.
Ontem à noite, acordei com o som de um sussurro. Não sei como, mas sabia que era meu nome.
Hoje de manhã, olhei no espelho e percebi que não conseguia lembrar como era minha vida antes da caixa. Não me lembro do rosto do meu namorado. Não me lembro das vozes dos meus amigos. Não me lembro se já morei em outro lugar. Mas o bebê ainda está aqui. E agora ele está sorrindo.
0 comentários:
Postar um comentário