domingo, 3 de agosto de 2025

Não Leia no Escuro

Desde pequena, meu pai sempre me dizia para não ler no escuro. “Isso vai machucar seus olhos”, ele dizia.

Depois, ele apontava para os óculos grossos que usava. “Viu? Você teria que usar isso o tempo todo, igual ao papai.”

“Acho que eles são legais”, eu respondia.

Ele sorria para mim e apenas acariciava minha cabeça suavemente. “Só não faça isso.”

Eu sempre fui a menina obediente do papai, mas, aos 13 anos, os hormônios pareciam não querer que eu continuasse assim.

Naquela noite, meu pai estava fora. Ele disse que era uma viagem de negócios. Minha mãe ficou em casa comigo, como sempre. Mas ela nunca se importava muito com o que eu fazia, desde que não machucasse ninguém.

Então, às 22h38, com as luzes completamente apagadas, eu estava deitada na minha cama, lendo histórias de terror na internet. Sempre gostei de terror, mas o escuro realmente adiciona algo às histórias, algo que eu nunca tinha sentido antes, e eu estava adorando. O simples som da minha mãe subindo as escadas fazia minha pele arrepiar — era uma sensação boa demais.

Só que, àquela hora, minha mãe já deveria estar na cama.

O som dos passos ficava cada vez mais alto, o que significava que minha mãe, ou quem quer que fosse, estava se aproximando, muito perto. Puxei o cobertor sobre a cabeça. Meu celular estava na minha mão, com a tela ainda acesa; a luz dele me dava algum conforto, embora só então eu tenha percebido que seria mais reconfortante se eu tivesse corrido para acender a luz. Tentei pensar que talvez minha mãe estivesse apenas assistindo TV até mais tarde naquela noite, mas minha mente insistia em dizer: “Não, ela não estava.”

Então, a porta se abriu lentamente. Estava escuro lá fora também; nenhuma luz entrava no meu quarto. Só sabia que a porta tinha sido aberta por causa do rangido que ela fez ao se mover.

“Menina má.” Para minha surpresa, era a voz de um homem — uma voz muito familiar.

Levantei o cobertor e pulei da cama com uma excitação alegre.

“Papai!”

Ele olhou diretamente para mim, mas seus olhos estavam diferentes. Eu conseguia enxergá-los no escuro. Era como se eu pudesse ver a silhueta que formava a figura do meu pai, mas, em vez disso, não via nada. Dentro das linhas que compunham sua forma, tudo era preto, como o ambiente ao redor, exceto pelos olhos. Eu podia ver o branco dos olhos dele brilhando no escuro; estavam arregalados, muito maiores do que os olhos que eu conhecia, encarando-me como se ele fosse um germofóbico e eu, uma barata na cama dele.

“Papai?” Ele ficou lá, sem dizer nada.

“Você está bravo comigo? Desculpa-me.” Embora eu não entendesse por que ele ficaria tão bravo só por eu estar lendo no escuro, achei melhor apenas me desculpar e evitar fazer isso (ou ser pega fazendo isso) novamente.

Então, vi mais branco.

Não eram só os olhos. Agora, eu via os dentes dele também.

Ele estava sorrindo com a boca aberta, mostrando todos os dentes brilhantes. E quando digo todos, é porque eram todos mesmo. O sorriso era tão grande que exibia cada dente. Nunca tinha visto a boca dele assim. Agora, ele fazia uma expressão que eu nunca tinha visto e jamais imaginei que veria.

“Você está me assustando. Não vou fazer isso de novo, prometo. Por favor, para com isso.”

A cabeça dele inclinou para a direita. Não foi um movimento leve, mas um giro rápido, direto para 90 graus.

Eu estava tremendo a essa altura, já não tinha certeza se aquele era mesmo meu pai.

Para piorar, ele começou a caminhar em direção à minha cama. Eu podia ver o branco dos olhos e dos dentes ficando maior à medida que ele se aproximava, passo a passo.

“Menina má, muito má.” Após essa frase, ele agarrou meu cabelo e me puxou para perto do rosto dele — tão perto que o branco ocupava metade da minha visão.

“Você está me machucando!” gritei.

Queria que ele parasse, claro que ele não parou. Em vez disso, começou a arrancar meu cabelo. Não um fio, mas muitos de uma vez, e não um por um, mas um punhado a cada puxão. Eu podia sentir o cheiro de sangue, embora não fosse o suficiente para me cegar do rosto sorridente à minha frente.

Gritei, gritei e chorei por minha mãe, esperando que ela viesse me salvar.

Infelizmente, ela entrou.

Olhei para cima. Era difícil enxergar com o rosto do meu pai tão perto, mas eu a vi ali, parada na porta que permanecia aberta.

Ela tinha o mesmo rosto que ele.

Olhos arregalados. Sorriso escancarado. Brancos brilhantes.

“Menina má, muito má.” A mesma frase, mas agora com outra voz — a voz da minha mãe.

Ela se aproximou de mim e agarrou minha mão direita. Tentei puxar a mão de volta, mas ela tinha a força de um monstro. Era como se minha mão estivesse colada à dela com supercola.

Então, ela começou a quebrar meus dedos, um por um.

“Mão má.”

Eu gritava tão alto que comecei a perder a voz. Não demorou muito para que só saíssem suspiros roucos.

Eles continuaram fazendo o que estavam fazendo. Não demorou muito para terminar, já que eu só tenho dez dedos e uma cabeça. Mas não acabou aí. Meu pai passou as unhas afiadas pelo meu rosto, elas perfuraram minha pele, fazendo o sangue escorrer. Ao mesmo tempo, minha mãe começou a arrancar minhas unhas.

Acabei sem nenhum cabelo no couro cabeludo, com sangue escorrendo pelo rosto até a cama, todos os dedos quebrados e nenhum com unhas.

Não podia ver o estrago, estava escuro demais. Mas eu sentia, sentia tudo o que eles fizeram comigo.

Sabia que não gostaria do que ia ver. Mesmo assim, alcancei a luz.

E senti dois dedos perfurando meus dois olhos. Antes estava escuro, mas agora era um escuro absoluto, completo. Não conseguia mais ver nem os olhos nem os sorrisos deles.

E agora, é escuro para sempre.

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