segunda-feira, 18 de agosto de 2025

Algo está me caçando, mas ninguém acredita em mim

As sombras se mexem. Eu venho vendo elas engrossarem, afinarem e ganharem forma desde que era criancinha.

Meus pais sempre me chamavam de "esquisito"; no sentido de que não acreditavam em mim. Primeiro, achavam que eu precisava de óculos ou que tinha algum problema mental, mas todos os exames deram negativo. No papel, eu supostamente tenho hiperfantasia, mesmo que eu claramente tenha bombado naquele teste também.

Acho que isso é a coisa mais frustrante da minha situação atual. Eu consigo ver claramente o que é, sem dúvida, algo de outro mundo passeando casualmente pela casa. Eu não reclamaria se fosse só uma sombra. Em vez disso, eu viro a cabeça e vejo umas dúzias de criaturas escuras como o céu noturno e completamente imateriais me encarando dos cantos, do teto ou até atrás de um familiar.

Eu não tenho medo delas, ou pelo menos não tinha até uns dias atrás. Sabe, depois de quase duas décadas de olhos inumanos — duvido que eles se qualifiquem como olhos de verdade — te seguindo, você começa a reconhecer rostos, e ouso dizer intenções.

Por exemplo, tinha uma sombra que passava pela porta do meu quarto toda noite, durante três anos, quando eu era adolescente. Ele era uma das sombras mais "bem costuradas" que eu já vi. O corpo era magro e mais ou menos humano, exceto pela cabeça em forma de cervo, duas vezes maior e com dois chifres grandes saindo dela. Ele não fazia nada de mais, só... meio que dava uma conferida em mim.

Aí, uma noite eu sonhei que estava sendo perseguido. Não lembro por quem ou pelo quê, mas nesse sonho o homem-cervo apareceu e interferiu, e depois que eu acordei, nunca mais o vi.

Isso não quer dizer que as sombras sejam "boas" em si; de jeito nenhum. Tem cabeças se mexendo no canto do meu olho o tempo todo, tentáculos e gavinhas de gosma escura subindo as escadas em plena luz do dia, e algo como um híbrido de gato e cabra pendurado de cabeça para baixo no teto bem acima da minha cama nos últimos um ano e meio, e eu fico só esperando ele cair em cima de mim — tenho certeza de que vai.

Faz talvez uma semana que essa coisa idiota parou de sumir. Ele tem uma cabeça tipo de touro, só que sem chifres ou nariz. Em vez disso, a única coisa que decora o rosto dele, além dos olhos, é um sorriso em forma de meia-lua — o tempo todo. Eu chamaria de "pernas-longas", mas até isso é pouco; as quatro patas dele são como macarrão, e ele corre como um cachorro faria — só que na velocidade de uma chita no auge, pronto para dar o bote na presa. Nesse caso, eu.

Ele fica subindo as escadas sem parar, não importa a hora do dia. Fica espiando o meu quarto do corredor, ou de pé nas patas traseiras e se inclinando para o lado, ou de quatro e virando a cabeça como uma animação malfeita. Ele é tão ativo que eu não vi outra criatura desde que ele apareceu.

O ponto de ruptura veio nas últimas cinco horas. Eu tinha saído para um encontro com a minha melhor amiga, a Suza, e enquanto ela me deixava em casa, ela apertou minha mão com força.

A Suza é "esquisita" como eu. Como nós duas fomos meio ostracizadas desde pequenas, encontramos consolo uma na outra. Ela, basicamente, prevê eventos que mudam a vida, geralmente envolvendo hospitais ou morte.

Voltando ao que aconteceu, ela pegou minha mão e me fez jurar que não ia sair do quarto de jeito nenhum depois que eu entrasse. Nem preciso dizer que peguei o sal da cozinha e uma cruz no caminho para cima. Não me pergunte sobre religião — com as coisas que eu vi, eu me recuso a discutir com ninguém além de Deus.

Nas últimas quatro horas, tudo estava tranquilo, sem problemas. Aí, meu irmão se ajeitou na cama dele do outro lado da minha — a gente divide o quarto — e as luzes do corredor se apagaram. Meu instinto gritava para fechar a porta, mas em vez disso eu peguei uma lanterna — e vi ele. O "Pernas-Longas" tinha passado pela porta e estava de pé nas patas traseiras, me encarando diretamente.

Eu finalmente consegui ver... tudo sobre ele, na real. A altura, a anatomia, cada pensamento que ele podia formar por trás daquele sorriso que nunca para. Um nó subia na minha garganta, e rápido.

Mas eu não conseguia me mexer. O sal, a cruz e uma faca que eu sempre tenho na mesa estavam a só uns metros de distância. Mas eu estava congelado. Fiquei ali parado, encarando ele, e ele fez o mesmo.

A meia hora que o relógio marcou que a gente ficou ali, a um braço de distância um do outro, não pareceu tão curta. Eu juraria que foram horas, talvez até dias, e o sol só não tinha nascido — eu não duvidaria que ele manipulasse o tempo. Quando ele finalmente foi embora, deu um passo para trás e sumiu pelo corredor.

Eu comecei a chorar ali mesmo, largando a lanterna antes de fechar a porta.

Agora eu tô encostado na porta, escrevendo isso. A internet é eterna, e mesmo se algo acontecer comigo, alguém vai saber. Ele não foi embora, eu sinto ele por aí em algum lugar.

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