Conheci o Aaron no meu último ano da faculdade. Ele não era meu tipo no começo — alto demais, quieto demais, meio... parado. Mas ele tinha um jeito de me escutar que me fazia sentir como se eu fosse a única pessoa no mundo. Nos casamos três anos depois.
Nos primeiros cinco anos, éramos o clichê do “casal perfeito”. Viagens, jantares com amigos, piadas internas. Ele nunca levantava a voz, nunca perdia a paciência. Se eu tivesse que descrevê-lo em uma palavra, seria “seguro”.
Mas então, pequenas coisas começaram a me incomodar.
Tudo começou com o porão.
O Aaron não me deixava descer lá. Não era no estilo “não mexa nas minhas ferramentas” — era mais um “a porta está sempre trancada”. Ele dizia que era porque a escada era íngreme e eu era desajeitada. E eu acreditei. Por um tempo.
Depois, veio a questão da lavanderia.
Uma vez por semana, ele lavava as roupas dele sozinho. Não com as minhas, nem mesmo misturadas com outras roupas dele. Era sempre um conjunto específico: calça jeans, camiseta de manga longa e um moletom velho. Sempre cores escuras. Sempre tarde da noite.
Eu acordava às 2 da manhã com o barulho da secadora, mas ele nunca me deixava ajudar a dobrar as roupas. Dizia que eram “só roupas de trabalho”.
A primeira rachadura de verdade apareceu numa noite de janeiro.
O Aaron chegou tarde em casa. Muito tarde. Fiquei acordada esperando, andando de um lado para o outro na sala, imaginando acidentes de carro ou visitas ao pronto-socorro.
Quando ele finalmente entrou, quase às 3 da manhã, as mãos dele estavam tremendo. O moletom estava úmido. E havia uma mancha escura na manga.
“Tinta”, ele me disse. Mas eu sabia que ele estava mentindo.
Duas semanas depois, a notícia estourou.
Uma jovem foi encontrada em uma vala na periferia da cidade. Espancada, estrangulada. A polícia não tinha suspeitos. A foto que mostraram na TV me marcou — não porque eu conhecia a vítima, mas porque reconheci a vala. Ficava a menos de dois quilômetros de onde o Aaron trabalhava.
Tentei ignorar o pensamento. Juro que tentei.
Mas as coincidências começaram a se acumular.
Ele chegava tarde em casa. O noticiário falava de outra mulher desaparecida. E todas elas tinham sido vistas pela última vez perto do parque industrial onde ficava o escritório do Aaron.
Comecei a prestar mais atenção nas “roupas de trabalho” dele. No cheiro delas — metálico, como moedas e água sanitária. No jeito como ele as mantinha separadas. No fato de nunca jogá-las fora, por mais gastas que estivessem.
Na noite em que tudo fez sentido, eu nem estava procurando provas.
Estava procurando papel de presente no armário quando encontrei a caixa de sapatos. Estava escondida atrás de casacos velhos, embrulhada em um saco de lixo. Dentro, havia fotografias. Dezenas delas.
Todas de mulheres. Algumas sorrindo à luz do dia. Outras tiradas à noite, com os rostos iluminados pelo flash da câmera. Algumas estavam dormindo. Outras estavam claramente... mortas.
Deixei a caixa cair. Meu corpo simplesmente se recusou a segurá-la.
Quando o Aaron chegou em casa, tentei agir normalmente. Não consegui. Minhas mãos não paravam de tremer.
Ele percebeu. Claro que percebeu.
“Que foi?”, ele perguntou.
Abri a boca para mentir, mas então vi — um único fio de cabelo preso na manga dele. Longo, loiro. Eu sou morena.
Não dormi naquela noite. Não me mexi. Fiquei deitada, ouvindo ele respirar ao meu lado, imaginando quantas mulheres adormeceram ao lado dele e nunca mais acordaram.
Na manhã seguinte, liguei para a polícia do meu carro. Contei tudo. As roupas. A caixa de sapatos. O cheiro.
Eles me disseram para sair de casa e esperar.
Isso foi há duas semanas.
Eles o prenderam discretamente, na entrada da nossa casa. Eu assisti tudo da janela de um vizinho enquanto o colocavam algemado no carro da polícia. Ele não resistiu. Nem parecia surpreso.
Encontraram seis corpos. Acham que há mais.
Estou dando este depoimento agora porque não sei como tirar isso de mim. Porque fico repassando cada jantar, cada beijo, cada noite encolhida ao lado dele — e me perguntando quantas vezes estive a um passo de me tornar a sétima.
Se você está lendo isso e acha que conhece a pessoa com quem está... Pense de novo. Alguns monstros não rugem. Eles sorriem, perguntam como foi seu dia e seguram sua mão enquanto lavam o sangue das roupas.
0 comentários:
Postar um comentário