segunda-feira, 8 de setembro de 2025

A Casa do Avô

Nossa comunidade a chamava de "Casa do Avô". Não por algum velho benévolo que morava lá, mas porque estava lá há tanto tempo, ininterrupta, desde que nossa rua foi construída. Era uma monstruosidade vitoriana, com tinta descascada e telhados inclinados, com um jardim que absorvia o sol. Nós crianças desafiávamos um ao outro para tocar sua cancela enferrujada, nossa coragem desaparecendo no instante em que nossos dedos tocavam o metal frio.

Meu irmão mais novo, Leo, era diferente. Ele tinha oito anos, com um cabelo castanho bagunçado e uma imaginação que era um pesadelo de baixa qualidade para meus pais. Onde nós vimos uma casa assombrada, Leo via um castelo. Onde ouvíamos o gemido da madeira podre no vento, ele ouvia a respiração de um gigante adormecido.

E ele viu a figura na janela.

Seu nome, explicou ele para nós, era Sr. Alistair. Ele próprio lhe explicou isso. O Sr. Alistair era imensamente velho e imensamente solitário, e possuía os mais belos brinquedos de todo o mundo em sua grande mansão. Ele mostrou a Leo uma caixa de música que cantava uma melodia mais antiga que as nações, e uma boneca com bochechas de porcelana que pareciam quase reais.

Meus pais, inicialmente, estavam em crises. O perigo de estranhos era ensinado a nós, e um homem pálido e magro gritando o nome de seu filho da janela do segundo andar era o tipo de história que fazia com que eles fossem à polícia. Mas a polícia não encontrou nada. Nenhum Alistair nos registros, nenhuma indicação de entrada ou saída, apenas poeira e a lenta decadência de um século. Eles consideraram isso uma imaginação exagerada de uma criança. Naturalmente, Leo era a única pessoa que já o havia visto.

Eu tinha doze anos. Velho o suficiente para saber que monstros não existem, mas ainda jovem o suficiente para ter medo das trevas. Comecei a vigiar a casa. E comecei a observar uma rotina.

O Sr. Alistair aparecia no final da noite, aquele período sujo e indistinto entre luz e escuridão. Ele nunca acenava, mas simplesmente ficava lá, um borrão branco contra o vidro escuro, esperando. E Leo parava o que quer que estivesse fazendo, seus olhos automaticamente fixos naquela janela como se estivessem presos por um fio.

Foi naquela noite quando o céu escureceu para o roxo, e Leo não estava em sua cama. O terror gelado, mais agudo do que qualquer um que eu já havia conhecido, cortou meu estômago. Eu não contei para mamãe e papai. Apenas corri.

A cancela da Casa do Avô estava aberta. Ela nunca estava aberta antes.

A porta da frente também estava aberta, uma abertura de escuridão profunda esperando. O ar que escapava era frio e tinha o cheiro de rosas secas e terra antiga. Chamei o nome de Leo, e minha voz foi engolida pelo silêncio profundo dentro.

Encontrei-os em uma grande sala de dança, mas não havia nenhum móvel, nenhum enfeite, apenas um grande espaço vazio e um chão poeirento. Leo estava apoiado em um raio de luz que diminuía de uma janela superior, segurando a mão do Sr. Alistair.

Ele era pior do que as palavras de Leo. Ele não era apenas pálido; ele era sem cor, seu rosto como uma fotografia deixada na calçada sob o sol. Seu corpo era tão magro que parecia emaciado, reduzindo seu terno preto a um vazio fingimento de homem. Mas seus olhos... eram jovens. Azuis, famintos, que olhavam para meu irmão com uma ternura crua que fez minha pele se contorcer de repulsa.

"Leo", sussurrei suavemente, minha voz tremendo. "Vá embora daí."

O olhar do Sr. Alistair se moveu em minha direção. Não havia brilho de maldade em seus olhos, nem de raiva. Apenas uma enorme, antiga paciência, muito mais assustadora.

"Ele não é para você", o homem disse para ela. Sua voz era tão seca quanto folhas virando em um livro antigo. "Ele é um pequeno esperto. Todos são, por um tempo. Mas eles desbotam rapidamente. Sua luz se apaga."

Ele se ajoelhou diante de Leo, deslizando suavemente e de maneira muito errada. Ele não dobrou os joelhos, mas seu corpo se reorganizou. Ele passou o dedo, branco e longo como um osso, pela face de Leo.

"Eles são como vespas", o Sr. Alistair ofegou, e talvez eu tenha ouvido perfeitamente. "Você os pega nas mãos, você adora sua preciosa, pequena luz. Você tenta capturá-los em um frasco. Mas eles sempre, sempre morrem. A luz é a melhor, e é tão fugaz."

Ele olhou para mim, e seu rosto calmo finalmente se quebrou, revelando um oceano de vazio e uma fome tão voraz que parecia que a sala havia mudado.

"A jarra é apenas o corpo", ele disse. "Ela quebra. Ela apodrece. Mas a luz... a pureza, a inocência, o delicioso prazer... esse é o conteúdo. Eu não levo seus corpos. Eu nunca... destruiria a jarra. Até que a luz dentro tenha sido totalmente... saboreada."

Ele deu um passo mais perto de Leo, que estava parado ali congelado, um pequeno sorriso beatífico brincando nos lábios.

"Eu gosto disso", o Sr. Alistair respirou, seus lábios milímetros da testa do meu irmão. "Eu bebo isso. Lentamente. Se eu for cuidadoso, pode demorar anos. Eu os mantenho felizes. Eu trago-lhes brinquedos e histórias de fadas e todo o amor que uma criança já precisou. Eles nunca têm um momento de dor ou medo. Eles vivem em uma infância dourada perfeita até a última centelha de sua luz ser minha."

Seus lábios se abriram. Não largamente, como na televisão. Uma breve, involuntária separação dos lábios, mas dela senti uma puxada. Não uma explosão física, mas uma puxada de algo mais. O calor começou a sair da sala. A já desvanecente luz do crepúsculo lá fora parecia escurecer ainda mais. A energia zumbiente de Leo, seu riso ridículo, sua curiosidade impossível de controlar - senti-me puxado para aquela terrível, voraz escuridão.

E quando a luz se for", ele respirou, sua voz vibrando contra a pele de Leo, "e só restar o vazio da jarra. Eu o guardo. Eu os armazeno todos. Na escuridão abaixo. Para que eu possa sempre lembrar da luz que eles carregavam."

E então eu os vi. Contra as paredes da sala de dança, nos cantos escuros, estavam outras formas. Pequenas, imóveis e quietas. Duzentas delas. Crianças. Sentadas rígidas, seus olhos abertos e vazios, sua pele pálida e amarelada. Uma série de frascos vazios.

Eu não pensei. Gritei e bati nele. Foi como bater em uma estátua de mármore. Ele não se moveu, mas sua cabeça girou aquelas horríveis e jovens olhos em minha direção. Ele parecia satisfeito.

"A amizade de um irmão", ele ponderou. "Uma outra idade. Bruta e quente. Mas ela se torna amarga tão rápido com a idade."

Ele levantou sua outra mão para mim, e uma exaustão total, mais do que sono, tomou conta de mim. Meus joelhos fraquejaram. Eu pensei em xarope. Eu só queria cair no pó e esquecer.

Eu via Leo. Meu irmão mais novo. Seu sorriso crescendo distante, sonhador, longe.

Eu lutei contra a lentidão, lutando para me levantar. Eu não o ataquei novamente. Olhei para a janela, para a luz fade do sol. E me lembrei. Ele só saía ao crepúsculo.

"Você não pode tê-lo!", gritei, minha garganta dolorida. Eu tropecei até a janela enorme e comecei a rasgar as cortinas pesadas cobertas de mofo.

A paciência do Sr. Alistair se esgotou. Um som de chiado, o som de vapor saindo de uma sepultura, escapou de seus lábios. Eu vi medo pela primeira vez nos olhos azuis, olhos azuis antigos. Não medo de mim, mas terror da luz do sol morrendo.

Com um último soluço, a cortina caiu. O último pedaço de pôr do sol, uma linda laranja sangrenta, cortou a sala.

Não o machucou. Não o transformou em cinzas. Mas ele se desmanchou. Seu corpo parecia perder definição nas bordas, derretendo-se. Ele se movimentou para trás, soltando Leo, que piscou e caiu no chão como um fantoche cujas cordas foram cortadas.

O corpo do Sr. Alistair se dissolveu na escuridão abraçando o outro lado da sala, seus olhos famintos e jovens os últimos a desaparecer, fixos em meu irmão com um olhar de infinita, tristeza amorosa.

Peguei Leo e corri. Nós nunca olhamos para trás.

A polícia encontrou nada na Casa do Avô, claro. Apenas poeira. Eles disseram que Leo deve ter dormido lá depois de um jogo de esconde-esconde, que sua história fervorosa era apenas um sonho.

Leo tem quatorze anos agora. Ele não se lembra do Sr. Alistair, da caixa de música, ou da sala de dança. Ele é mau-humorado, e passa muito tempo olhando para seu telefone, e brigas com meus pais sobre dever de casa. Ele é normal.

Mas às vezes, quando a luz está exatamente ao crepúsculo, eu o encontro parado imóvel. Ele olha pela janela para aquela casa velha, e um suave, melancólico sorriso cruza seus lábios como se lembrasse de um sonho lindo e efêmero. E naquele momento, vejo uma pequena, linda centelha que foi. diminuída.

Eu observo a casa também. Os novos proprietários que a compraram, os que pagaram um preço baixo por ela e a reformaram, me dizem que é maravilhosa. Tanto espaço para as crianças.

Eles têm um menino. Ele tem oito anos. Ele tem cabelo castanho selvagem.

E às vezes, ao crepúsculo, eu vejo um vago mancha na janela do segundo andar. Esperando. Já não por meu irmão.

Ele tem um novo frasco para sua coleção.

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