Eu me mudei para o prédio porque era barato, antigo e perto do trabalho. Era um daqueles apartamentos de tijolo pré-guerra, em ruínas, com papel de parede descascando, luzes amareladas e corredores estreitos que sempre tinham um leve cheiro de poeira e algo mais que eu não conseguia identificar.
Meu apartamento ficava no segundo andar. O terceiro andar, segundo o proprietário, estava “fechado para reformas”. O elevador não ia até lá, e a escadaria tinha uma corrente enferrujada esticada nos últimos degraus, com uma placa desbotada de “NÃO ENTRE” mal pendurada. Ele não disse mais nada, e eu não perguntei. Só queria um lugar tranquilo e barato.
Os primeiros dias foram normais. Eu chegava em casa, esquentava qualquer jantar que pudesse pagar, assistia a alguns programas e caía no sono. Mas por volta da quarta noite, comecei a ouvir barulhos vindos do terceiro andar. No início, eram fracos — como passos arrastando pelo chão. Eu disse a mim mesmo que talvez alguém estivesse trabalhando lá até tarde ou que os canos estavam com problema.
Mas depois os sons ficaram mais nítidos. Passos, lentos e pesados. Às vezes, batidas. Não rítmicas como uma máquina — irregulares, como dedos batendo na madeira. Então, comecei a ouvir uma respiração. Não através das paredes. Não de cima. Mas perto. Como se alguém estivesse logo atrás da minha porta à noite, exalando suavemente pelo nariz.
Perguntei novamente ao proprietário sobre o terceiro andar. Ele me olhou por um longo segundo e disse: “Não deveria ter ninguém lá em cima. Nenhum trabalhador. Se ouvir algo, ignore. E não vá xeretar.”
Naquela noite, deixei um copo d’água ao lado da cama e adormeci com fones de ouvido. Acordei exatamente às 2h11 da manhã. Meu quarto estava gelado. Os fones estavam fora dos meus ouvidos, colocados cuidadosamente na mesa ao meu lado. O copo d’água estava vazio. Não digo derramado. Digo seco como se não tivesse sido preenchido havia semanas. Sentei-me no escuro e apenas encarei a porta, o coração batendo forte no peito, sem me mover por horas.
Algumas noites depois, os barulhos recomeçaram. Mas dessa vez, eu podia ouvir algo sendo arrastado. Não móveis. Algo mais pesado, e mais macio, como tecido. Depois, sussurros. Não conseguia distinguir as palavras, mas vinham de cima.
Não consegui me conter. A curiosidade venceu. Fui até a escadaria, passei por cima da corrente e subi lentamente para o terceiro andar. Cada degrau rangia como se gritasse para ser notado. Quando cheguei ao topo, o corredor estava completamente escuro. Minha lanterna mal atravessava a escuridão. As paredes estavam rasgadas. A tinta descascava em placas grossas. Todas as portas estavam fechadas, exceto uma, ligeiramente entreaberta no final do corredor.
Caminhei em direção a ela, cada instinto gritando para voltar. Mas empurrei a porta suavemente. O quarto estava vazio. Apenas poeira e tábuas quebradas no chão. Mas o ar parecia denso, como se eu estivesse debaixo d’água.
Então ouvi — atrás de mim. Uma expiração lenta.
Virei-me e vi a silhueta de alguém no final do corredor. Estava perfeitamente imóvel, com a cabeça ligeiramente inclinada. Sussurrei “Olá?”, mas não recebi resposta. Não se moveu. Não falou. Apenas me encarou.
Entrei de volta no quarto e bati a porta. Esperei, coração disparado, mão na maçaneta. Esperei por passos, pela porta tremer, por qualquer coisa. Mas nada aconteceu.
Eventualmente, abri a porta. O corredor estava vazio. A figura havia sumido.
Corri de volta para meu apartamento e arrumei tudo naquela mesma noite. Nem esperei pelo amanhecer. Deixei a chave na bancada da cozinha e saí. Não avisei o proprietário. Não contei a ninguém.
Uma semana depois, pesquisei sobre o prédio na internet. Sem notícias. Sem histórico. Nada sobre ele. Mas em um post de fórum, enterrado entre histórias de fantasmas e lendas urbanas, alguém mencionou o prédio pelo nome.
Disseram que ninguém morava no terceiro andar há mais de trinta anos. Não desde que o inquilino que vivia lá parou de sair do apartamento e as pessoas começaram a ouvir sua respiração através das portas.
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