Nunca consegui me despedir dele de verdade, nunca consegui abraçá-lo uma última vez, nunca consegui levá-lo para casa. Fiquei com tanta raiva de todos: meus pais, minha irmã, mas, acima de tudo, de mim mesmo. Como pude não estar lá por ele? Seria tão difícil ter dedicado um pouco mais de tempo? Não. Mas agora não adiantava, nada o traria de volta, por mais que eu quisesse. O funeral foi a única coisa que restou para fazermos por ele.
Foi quando os pesadelos começaram. Eu me via na cozinha, sem fazer nada de especial. Lá estava ele, olhando pela janela, a pele fria como gelo. Havia neve fresca no chão, e ele tinha um pouco na cabeça e nos ombros, como se já estivesse ali fora há um tempo. Ele não dizia nada, apenas me lançava um olhar triste que me acertava o peito com culpa e me deixava sem ar. Minha mente gritava para deixá-lo entrar, mas minhas pernas se recusavam a se mover. E ele continuava me olhando com os olhos mais tristes e cheios de saudade. Então, eu acordava em um mar de suor.
Queria que os pesadelos fossem o pior, mas não tenho tanta sorte. De manhã cedo, antes do sol nascer, ouvia arranhões do lado de fora do meu quarto. Todos os dias. Nas primeiras vezes, o som era tão leve quanto o de um rato, depois ficava mais agressivo e frenético, como se alguém estivesse cavando a parede com uma faca. Mas, ao chegar ao cômodo ao lado, não encontrava nenhum dano nas paredes.
Decidi instalar uma câmera. Nos primeiros dias, ela não captou nada além do sol nascendo e se pondo na janela. Então, depois de uma semana, ao verificar a filmagem acelerada, vi algo que fez meu coração disparar e meus pelos se arrepiarem. No canto da janela, havia um olho triste e injetado de sangue me encarando. Não estava olhando para a câmera, estava olhando para MIM. Eu sabia que ele podia me ver através da câmera, então fechei o laptop com tanta força que rachei a tela. Removi as câmeras depois disso.
Com o tempo, todos os dias, às 14h22, a porta da frente se abria e batia, como se alguém tivesse acabado de chegar em casa. No começo, achei que era aleatório, mas então lembrei que meu irmão chegava da escola exatamente nesse horário todos os dias. Novamente, ao verificar, tudo parecia normal. Por fim, nas noites tardias, pouco antes de adormecer, ouvia um choro suave. O tipo de choro que uma mãe teria por um filho perdido, ecoando baixinho nos meus ouvidos. Eu procurava e procurava, mas só encontrava escuridão. Foi quando percebi que vinha de fora. Minha culpa cresceu ao entender que aquilo de que eu tinha tanto medo era meu próprio irmão.
Uma pessoa só aguenta viver assim por um tempo. Como se a culpa não fosse suficiente, ele precisava me lembrar constantemente do meu fracasso como irmão mais velho, nunca me deixando descansar. Mas eu merecia isso. Quando ele estava vivo, pediu algo tão simples, e eu não consegui atender. Eu só ficava rezando para que ele melhorasse, esperando que um dia entrasse e o visse correndo para meus braços abertos. Isso nunca aconteceu, e ele me lembrava disso todos os dias.
Então, sempre que podia, eu me ajoelhava em seu túmulo recente e pedia perdão. Dizia que ele podia voltar para casa se quisesse, que finalmente poderia descansar, mas ele nunca respondia. Eu sabia que era tarde demais, mas precisava que ele me ouvisse. Após um dia particularmente difícil, fui ao túmulo dele e rezei novamente. Uma oração aparentemente comum.
Naquela noite, o pesadelo foi diferente. Como sempre, cheguei em casa e a encontrei vazia, com ele do lado de fora da janela. Ele começou a me lançar aquele olhar, mas senti minhas pernas funcionando. Caminhei lentamente até a porta da frente e a abri bem, permitindo que ele entrasse. Ele subiu os degraus de pedra pela última vez. Nesse momento do sonho, lágrimas escorriam pelo meu rosto, quase me cegando, enquanto o pegava em um abraço.
Sua pele fria e cabelo congelado me queimavam, mas eu me recusava a soltá-lo. Estava determinado a ficar ali com ele, a ajudá-lo. Ficamos abraçados pelo que pareceu uma eternidade e, ao mesmo tempo, um instante, e ele se aqueceu. Ele parecia como antes, feliz e cheio de vida. Ele só queria entrar. Só queria voltar para casa, e eu era o único que o impedia. Chorei em seu ombro, pedindo perdão, implorando para que nunca mais me deixasse.
Quando ele falou, foi tão bom ouvir sua voz novamente. Ele falou de forma clara e simples, e isso aqueceu o ambiente inteiro. Disse que estava tudo bem, que me perdoava, e isso só me fez chorar e abraçá-lo com mais força. Aos poucos, ele começou a deslizar para longe, e quando acordei naquela manhã, levei alguns minutos para absorver tudo o que vi. Foi quando percebi que não havia mais arranhões. A porta não se abriu e fechou naquele dia, e nunca mais ouvi o choro suave à noite. Meu irmão finalmente encontrou paz, e eu, por minha vez, também.
Nunca mais tive aquele sonho, apesar de todos os meus esforços. Nunca parei de pensar nele, nunca parei de pensar nos meus erros. Ele era apenas uma criança, e não havia nada que pudéssemos ter feito por ele. Ele sabia disso, mas tudo o que queria era voltar para casa, entrar e se aquecer. Eu te amo, Leonard, e espero te ver novamente um dia.
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