quinta-feira, 5 de junho de 2025

O Homem com a Lanterna

Eu tinha 11 anos quando aconteceu. A idade em que você ainda é ingênuo o suficiente para acreditar que o mundo é seguro, mas já tem idade suficiente para começar a sentir o arrepio de coisas que não fazem sentido.

Eram cerca de 19h30 quando minha mãe, minha irmã mais velha e eu estávamos voltando da festa de aniversário do meu amigo Reece. A noite já tinha se instalado, e os postes de luz piscavam enquanto passávamos por ruas conhecidas. Precisávamos fazer uma parada rápida no nosso antigo condomínio. Minha mãe estava ajudando uma amiga, que tinha acabado de se mudar para um novo apartamento, a desembalar suas coisas com seus bebês — Allen e Karsen. Então, estacionamos e saímos para ajudar.

Minha irmã estava ocupada com algumas caixas, e eu fui encarregado de carregar o penico de treinamento dos bebês pelas escadas externas. O tipo de tarefa que seria entediante em qualquer outro dia, mas naquela noite... parecia diferente.

Saí, meus sapatos batendo nos degraus de cimento frio enquanto descia. O ar noturno parecia mais pesado que o normal, como se estivesse me pressionando. Mas o que realmente me chamou a atenção foi o feixe de uma lanterna, piscando nas paredes do corredor da escada, iluminando o espaço escuro como se alguém estivesse procurando algo.

Eu congelei.

No pé da escada, ao lado de um carro velho e surrado, estava um homem. Seu rosto estava escondido pela escuridão, mas eu conseguia distinguir sua silhueta. Sua postura era estranha. Ele não se movia a princípio, apenas ficou lá, com a cabeça ligeiramente inclinada para baixo, como se estivesse olhando para o chão — mas não havia motivo para isso. No momento em que o vi, senti um arrepio subir pela minha espinha.

Tentei ignorá-lo e continuar andando, mas o homem ergueu a lanterna, o feixe de luz apontando na minha direção. Ele estava me observando agora, como se estivesse esperando por algo. Ele não disse uma palavra.

Minhas pernas endureceram, e eu corri de volta escada acima, segurando o penico de treinamento nos braços como se fosse algum tipo de escudo. Cheguei ao topo, respirando um pouco rápido demais para meu conforto, e encontrei minha mãe ainda desembalando no estacionamento.

“Mãe,” eu disse, minha voz um pouco trêmula. “Tem alguém lá embaixo... ele está só parado, me encarando.”

Minha mãe olhou para mim com um leve sorriso, distraída demais com a mudança para perceber o pânico na minha voz. “Ah, não se preocupe,” ela disse, descartando a preocupação. “É só o nosso antigo vizinho, Pennington. Ele está sempre lá fora consertando o carro.”

“Mas, mãe, ele... ele não parecia normal. Estava só me encarando... como se nem piscasse.” Eu não conseguia me livrar da sensação de que havia algo errado naquela situação.

Mas minha mãe não estava ouvindo. Ela voltou às caixas, acenando a mão de forma desdenhosa. “Ele é inofensivo. Não faça disso um grande problema. Ele está só cuidando do carro velho dele.”

Observei minha mãe se afastar, mas não conseguia apagar a imagem do homem, ainda parado lá, seu corpo rígido como um manequim. Hesitei antes de descer as escadas novamente para terminar minha tarefa.

E então... eu vi.

Ele tinha saído do carro.

A princípio, pensei que ele viria na minha direção, mas não — ele não se mexeu. Apenas ficou lá, ao lado do carro, as mãos mexendo em algo sob o capô. A lanterna ainda estava em sua mão, balançando de um lado para o outro enquanto ele “fingia” consertar o carro, mas toda a cena parecia errada. Seus movimentos eram rígidos, quase mecânicos.

Andei mais rápido, ansioso para voltar ao lado seguro da minha mãe. Ao me virar e olhar para o homem uma última vez, notei algo que fez um arrepio percorrer minha espinha: sua cabeça estava ligeiramente inclinada, como se estivesse me observando novamente, mas agora havia algo além de curiosidade em seu olhar. Era como se ele estivesse esperando por algo... talvez por mim?

Não esperei para descobrir.

Corri de volta para o carro, meu coração disparado. Mas, quando olhei por cima do ombro uma última vez, notei algo estranho. O carro estava vazio agora. Não havia sinal de Pennington, ou seja lá qual fosse o nome dele. Ele havia desaparecido completamente — sumiu na noite sem deixar rastros.

Partimos logo depois, e tentei me convencer de que minha mãe estava certa, que era apenas um vizinho excêntrico que gostava de ficar até tarde consertando seu carro. Mas toda vez que fecho os olhos e lembro do jeito que a cabeça daquele homem estava inclinada, do modo como ele me encarava sem piscar, não consigo afastar a sensação de que ele não era apenas um vizinho.

Até hoje, me pergunto se ele estava realmente esperando por mim, se talvez algo naquela noite não foi apenas uma coincidência. Às vezes, quando passo por aquele antigo condomínio, não consigo evitar de olhar, meio que esperando vê-lo parado nas sombras, lanterna na mão, observando, esperando.

Talvez eu nunca saiba. Mas uma coisa é certa: nunca mais consegui olhar para uma lanterna da mesma forma.

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