domingo, 1 de junho de 2025

Casa da Pensão

Na nossa cidade, existe um bairro residencial chamado “Orçamento”, e lá tem uma parada de ônibus chamada “Casa da Pensão”. Não costumo passar por ali com frequência, já que não tenho motivo pra isso e moro na parte oposta da cidade, mas já passei de carro algumas vezes. O bairro é meio deprimente — basicamente composto por casinhas de madeira de dois andares que já deveriam ter sido demolidas há muito tempo, algumas casas particulares com cercas podres, sem asfalto, claro, e ainda tem uma igreja que uns sectários estrangeiros construíram nos anos 90 (aliás, eles ainda estão por aí, não sei quem frequenta isso).

Pois bem, existe uma lenda urbana sobre essa parada “Casa da Pensão”. Dizem que, nas redondezas, por um tempo (mais ou menos dos anos 70 até o final dos 80), as pessoas viam figuras muito estranhas. Como só passa um único ônibus por ali, quem esperava na parada à noite ficava um tempão esperando. E foi assim que começaram a notar coisas esquisitas. Por exemplo, alguém via passar um homem sem os dois braços, com as mangas da camisa balançando vazias. Até aí, tudo bem, pode ser que o cara tenha sofrido um acidente e ficou inválido — só que, na nossa cidade, que não é lá muito grande, ninguém conhecia um inválido sem braços. Se fosse alguém local, ele seria reconhecido, mas nada. E não foi um caso isolado.

Teve outro caso de um homem que estava numa noite de outono, fumando na rua, quando passou por ele um anão com o rosto completamente torto, como se a pele do rosto tivesse sido puxada para um lado só. Claro que o cara ficou apavorado. Nos dias seguintes, ele tentou descobrir quem era, e o boato se espalhou pela cidade — mas ninguém conhecia esse anão, ninguém sabia de nada.

Outra história envolve uma garota que viu um homem com a cabeça queimada. E quando digo queimada, é no sentido literal: cabelo chamuscado, fuligem, queimaduras frescas, mas o sujeito andando como se nada tivesse acontecido, mãos nos bolsos, quase assoviando. A garota ficou com medo, não quis falar com ele, e o homem simplesmente passou por ela. Casos assim eram comuns — teve gente que viu um homem de dois metros e meio de altura, uma mulher com um rosto tão assustador que quem a viu saiu correndo, e até um gordo seminu pesando uns 150 quilos. E tudo isso num raio de poucos metros ao redor dessa parada de ônibus — em nenhum outro lugar da cidade essa galeria de aberrações aparecia.

E, por fim, uma das histórias mais assustadoras. Essa é atribuída a um motorista de lotação. Ele estava fazendo o último trajeto da noite, com o ônibus vazio, já que só faltavam duas paradas até o ponto final. Na “Casa da Pensão”, ninguém subiu, mas ele parou mesmo assim — talvez para resolver algum assunto. Já ia dar a partida quando, no facho dos faróis, apareceu — ou melhor, rastejou — uma garota que parecia ter uns quinze anos. Ela literalmente rastejava pela rua, como uma minhoca, sem usar as mãos, apesar de ter mãos e pernas. O motorista ficou pasmo. Quando se recuperou do choque, correu até ela, pensando que talvez estivesse passando mal ou paralisada. Perguntou o que havia de errado, mas a garota apenas o encarou, abriu a boca e emitiu uns gemidos desconexos. E, dentro da boca, NENHUM DENTE — todos arrancados ou quebrados, com sangue escorrendo. O motorista, já em pânico, se abaixou para ajudá-la a se levantar, mas então teve um choque ainda maior: de perto, percebeu que não era uma garota, mas um homem. Um cara grande, com cabelo curto, embora, segundos antes, ele tivesse certeza de que era uma garota. O sujeito agarrou a roupa do motorista e começou a puxá-lo. O motorista resistiu, mas o outro era forte, quase o derrubou, e ria em silêncio com aquela boca sem dentes, os olhos completamente selvagens. O motorista conseguiu se soltar, mas só porque a camisa rasgou, deixando um pedaço na mão daquele ser que ora era garota, ora homem. Quando viu que o sujeito voltou a parecer uma garota jovem, com cabelos longos e loiros, o motorista correu para o ônibus, engatou a ré e saiu em disparada. Não sei se ele contou essa história para a polícia ou para os parentes em casa, mas, em uma semana, a cidade inteira já sabia do novo incidente no “Orçamento”.

Hoje em dia, nada disso acontece mais naquele bairro — no início dos anos 90, toda essa bizarrice parou. Mas, como dizem, o trauma ficou, e a lenda urbana ainda circula. Eu, particularmente, não vou pra essa “Casa da Pensão” sozinho à noite nem por um decreto.

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Escritor do gênero do Terror e Poeta, Autista de Suporte 2 e apaixonado por Pokémon