Pois bem, existe uma lenda urbana sobre essa parada “Casa da Pensão”. Dizem que, nas redondezas, por um tempo (mais ou menos dos anos 70 até o final dos 80), as pessoas viam figuras muito estranhas. Como só passa um único ônibus por ali, quem esperava na parada à noite ficava um tempão esperando. E foi assim que começaram a notar coisas esquisitas. Por exemplo, alguém via passar um homem sem os dois braços, com as mangas da camisa balançando vazias. Até aí, tudo bem, pode ser que o cara tenha sofrido um acidente e ficou inválido — só que, na nossa cidade, que não é lá muito grande, ninguém conhecia um inválido sem braços. Se fosse alguém local, ele seria reconhecido, mas nada. E não foi um caso isolado.
Teve outro caso de um homem que estava numa noite de outono, fumando na rua, quando passou por ele um anão com o rosto completamente torto, como se a pele do rosto tivesse sido puxada para um lado só. Claro que o cara ficou apavorado. Nos dias seguintes, ele tentou descobrir quem era, e o boato se espalhou pela cidade — mas ninguém conhecia esse anão, ninguém sabia de nada.
Outra história envolve uma garota que viu um homem com a cabeça queimada. E quando digo queimada, é no sentido literal: cabelo chamuscado, fuligem, queimaduras frescas, mas o sujeito andando como se nada tivesse acontecido, mãos nos bolsos, quase assoviando. A garota ficou com medo, não quis falar com ele, e o homem simplesmente passou por ela. Casos assim eram comuns — teve gente que viu um homem de dois metros e meio de altura, uma mulher com um rosto tão assustador que quem a viu saiu correndo, e até um gordo seminu pesando uns 150 quilos. E tudo isso num raio de poucos metros ao redor dessa parada de ônibus — em nenhum outro lugar da cidade essa galeria de aberrações aparecia.
E, por fim, uma das histórias mais assustadoras. Essa é atribuída a um motorista de lotação. Ele estava fazendo o último trajeto da noite, com o ônibus vazio, já que só faltavam duas paradas até o ponto final. Na “Casa da Pensão”, ninguém subiu, mas ele parou mesmo assim — talvez para resolver algum assunto. Já ia dar a partida quando, no facho dos faróis, apareceu — ou melhor, rastejou — uma garota que parecia ter uns quinze anos. Ela literalmente rastejava pela rua, como uma minhoca, sem usar as mãos, apesar de ter mãos e pernas. O motorista ficou pasmo. Quando se recuperou do choque, correu até ela, pensando que talvez estivesse passando mal ou paralisada. Perguntou o que havia de errado, mas a garota apenas o encarou, abriu a boca e emitiu uns gemidos desconexos. E, dentro da boca, NENHUM DENTE — todos arrancados ou quebrados, com sangue escorrendo. O motorista, já em pânico, se abaixou para ajudá-la a se levantar, mas então teve um choque ainda maior: de perto, percebeu que não era uma garota, mas um homem. Um cara grande, com cabelo curto, embora, segundos antes, ele tivesse certeza de que era uma garota. O sujeito agarrou a roupa do motorista e começou a puxá-lo. O motorista resistiu, mas o outro era forte, quase o derrubou, e ria em silêncio com aquela boca sem dentes, os olhos completamente selvagens. O motorista conseguiu se soltar, mas só porque a camisa rasgou, deixando um pedaço na mão daquele ser que ora era garota, ora homem. Quando viu que o sujeito voltou a parecer uma garota jovem, com cabelos longos e loiros, o motorista correu para o ônibus, engatou a ré e saiu em disparada. Não sei se ele contou essa história para a polícia ou para os parentes em casa, mas, em uma semana, a cidade inteira já sabia do novo incidente no “Orçamento”.
Hoje em dia, nada disso acontece mais naquele bairro — no início dos anos 90, toda essa bizarrice parou. Mas, como dizem, o trauma ficou, e a lenda urbana ainda circula. Eu, particularmente, não vou pra essa “Casa da Pensão” sozinho à noite nem por um decreto.
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