quarta-feira, 25 de junho de 2025

O Prédio Espelhado

Morávamos no quinto andar de um prédio de oito andares — só eu e Jazz. O lugar não tinha nada de especial, apenas mais um apartamento velho numa parte negligenciada da cidade. Interfones quebrados, caixas de correio enferrujadas, grafites sobrepostos como anéis de uma árvore. Mesmo assim, era nosso.

Do outro lado do beco, havia outro prédio.

Idêntico. Mesma altura. Mesmo design. Mesma planta, janela por janela. Mas ninguém entrava ou saía dele. Sem pacotes. Sem entregas. Sem barulho. No começo, brincávamos sobre isso — chamávamos de “o gêmeo fantasma”.

Até que eu encontrei a entrada.

Uma tábua empenada no armário do corredor. Sob ela, um espaço rasteiro, grande o suficiente para alguém magro e desesperado. Peguei uma lanterna. Deixei Jazz dormindo no sofá. Quando emergi, estava no prédio espelhado.

Cada andar parecia um cenário diferente. Uma sala de aula com tinta descascando e desenhos falsos de alunos. Uma ala hospitalar, com camas recém-arrumadas, mas cobertas de poeira. Uma igreja com bancos quebrados e alto-falantes sussurrando sermões ao contrário.

Mas o oitavo andar era diferente.

As paredes eram forradas com velas em forma de caveiras. Luzes estroboscópicas e feixes coloridos piscavam em padrões rítmicos. Projetores exibiam filmes caseiros antigos — imagens tremidas de famílias, churrascos, aniversários — pessoas que eu nunca tinha visto.

Parecia algo montado. Encenado.

Jazz implorou para que eu não voltasse. Disse que tinha pesadelos quando eu ficava muito tempo lá. Disse que acordava com sons atrás das paredes. Mas eu não conseguia parar. O prédio me atraía. Como se quisesse ser visto.

Então veio a noite em que fui jogar o lixo fora.

No terreno atrás do prédio, vi um carro com o porta-malas aberto. O mesmo veículo preto que sempre parecia estacionado perto da entrada do prédio espelhado. Um homem estava lá, enorme, de ombros largos. No banco traseiro, um corpo — vivo, amarrado. O homem se inclinou com precisão cirúrgica, segurando uma lâmina.

Não foi rápido. Foi metódico. Um procedimento.

Deixei uma lata cair. Ela bateu no asfalto com um estrondo. O homem olhou para cima.

Ele usava duas máscaras — uma de borracha, outra branca como osso por baixo. Seus olhos fixaram-se nos meus, sem piscar.

Eu corri.

Pensei em chamar a polícia, mas meu celular estava dentro do apartamento. Eu não podia arriscar voltar. Ainda não.

Bati em portas no nosso prédio. Depois, no outro. Silêncio.

Encontrei um grupo de pessoas do lado de fora — um casal com cachorros, um homem mais velho. Implorei por ajuda.

“Por favor”, eu disse. “Ele está machucando alguém. Está no prédio. Precisamos chamar ajuda.”

“Não temos celulares”, disse o homem. “Mas vou verificar a linha fixa.”

Enquanto esperava, os cachorros rosnaram. Ajoelhei-me no chão, braços abertos, tentando mostrar que não era uma ameaça. O casal os puxou para trás, me protegendo.

O homem voltou, balançando a cabeça. “A linha está morta. É melhor você ir. Não queremos problemas.”

Problemas. Aquela palavra de novo. Como se eu tivesse trazido algo comigo.

Depois de meia hora de ruas vazias e batidas sem resposta, voltei. Tive que voltar. Jazz ainda estava lá dentro.

A porta do nosso apartamento estava entreaberta.

Lá dentro, ele estava esperando. Sentado no nosso sofá. Como se pertencesse ali.

Ele segurava meu celular com mãos enluvadas. Virou a tela para me mostrar: dezenas de fotos. Capturas de tela. Imagens de mim invadindo o prédio espelhado. Escalando túneis secretos. E pior — fotos minhas, íntimas. Jazz e eu na cama. No chuveiro. Espontâneas. Vulneráveis.

Ele estava nos observando. Gravando tudo.

E Jazz não estava em lugar nenhum.

O homem se levantou lentamente. Uma montanha de pessoa. Ele apontou para o banheiro perto da porta de entrada. “Vamos conversar aqui.”

Eu recuei para dentro. Pensei que talvez pudesse prendê-lo, escapar de alguma forma.

Ele abriu a torneira. O fio fraco de água jorrou. O suficiente para abafar o som.

Então ele atacou.

O primeiro golpe me jogou dentro da banheira. O segundo quebrou a haste da cortina. Ele me bateu, esmagou meu corpo contra as paredes. Minha cabeça bateu na torneira repetidamente. Senti meu ombro deslocar. Costelas cederem. Gritei, mas a água engoliu o som.

Eu lutei. Sei que lutei. Mas eu era pequeno. E ele era um monstro.

Em algum momento durante o ataque, algo mudou. Minha visão distorceu.

Eu não estava mais no meu corpo. Eu estava assistindo.

Ele continuou, mesmo depois que parei de me mover. Meus braços pendiam frouxos. O sangue se acumulava nas rachaduras dos azulejos. Eu o vi limpar a lâmina, ajeitar a cortina do chuveiro, recolher suas ferramentas.

Foi quando entendi.

Todo aquele prédio tinha sido construído para isso. Um labirinto de salas de jogos e palcos, espelhos e distrações. Um lugar para ele caçar, perseguir, matar.

Minha morte não foi a primeira. Não seria a última.

Mas alguém vai encontrar isso. Talvez você.

E quando você vir um prédio que parece exatamente com o seu — perfeitamente espelhado, estranhamente vazio — não entre. Não olhe pelas janelas. Não siga as luzes piscando.

Porque ele está esperando.

E você já está no filme.

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