sábado, 3 de maio de 2025

Alguém já ouviu falar deste livro estranho?

Minhas viagens pela vida me deixaram perdido. Meu mestrado em Poesia me deixou falido. Sem vontade alguma de escrever, Eu me sentia como se fosse apenas um fantasma.

Disseram-me: "Você precisa de inspiração." 

"Vá ler um livro novo para ter ideias."  

Pensei que não havia mal em tentar. Além disso, estava trancado em casa havia o que pareciam anos.

O sol ardente brilhava como um tirano. Meus olhos, danificados pela luz azul, mal aguentavam. Mais de vinte horas em um documento de texto, era o bastante para quebrar o mais forte dos homens.

Com uma renda no vermelho, eu não tinha muito dinheiro para gastar. Sabendo que não podia comprar nada novo, tinha um lugar em mente no centro da cidade.

A livraria de livros usados perto de mim tem ótimos preços. Procurando, encontrei um livro de poemas, no fundo da pilha de liquidação. 
O título dizia: *Os Sussurros do Tâmisa*.

O nome na capa era William Shakespeare. Nunca ouvira falar dele em tal obra. A capa amarela, envelhecida e desbotada pelo sol, páginas com bordas douradas, agora cobertas de sujeira.

Nunca vira um livro em tão mau estado, embora muitos dos que vendiam fossem bem gastos. Com cuidado, abri uma página ao acaso, e , daquele momento em diante, meus olhos não se desviaram.

Folheei, minhas mãos ansiosas, encantadas, absorvendo o texto como ar nos meus pulmões. Meus olhos hipnotizados, mal ousava respirar. Pois cada sílaba fazia meu coração pulsar.

A história falava de segredos perdidos no tempo. Um rio que revelava verdades aos que oravam. Um dramaturgo que sabia que não podia resistir, a história de uma peça há muito proibida.

Esse homem escreveu os segredos agora revelados. Escreveu com tinta até que ela secasse. Sua pena de pluma ficou vermelha, seu corpo exausto, jurando que terminaria ou morreria.

O homem, cuja mente era fraca, diferente da minha, falava de uma fome impossível de saciar. Ele leu a peça por dias e dias sem parar, até que restassem apenas o livro e os ossos.

Além dos meus olhos cansados, o sol se pôs. Hipnotizado, não notei que uma hora passara. Absorto em histórias, reis e bailes de máscaras, seus crepúsculos brilhavam duas vezes mais além do vasto.

A voz de um homem gritou sobre as ondas quebrando. Falava como se eu fosse surdo ou lento para aprender. Como se eu fosse um estorvo em seu caminho,  suas palavras vazias, zumbidos de desprezo estéril.

"Vamos lá, cara, já passamos dez minutos do horário de fechar. Você pode, tipo, sair agora?  Todos os meus colegas foram embora, me disseram para trancar, quando eu conseguisse fazer você largar esse maldito livro."

Com punhos de marfim, agarrei meu tomo precioso. O que pareceram horas, incapaz de falar. Meus pensamentos indignos até serem envoltos em ouro que finalmente soltei um guincho rouco.

"Não abandonarei esta obra de arte pura. Prefiro ser encontrado no círculo mais profundo do inferno. Pois sei que não há dor maior do que a separação do meu rei."

Não consegui conjurar mais palavras. Pelo menos nenhuma que eu soubesse que seria aceita. A ideia de falar fora de tom era absurda. Prefiro o silêncio a deixar a sujeira consumir.

O homem se abaixou e pegou seu celular, digitou três números, e o toque começou. Um sussurro do Tâmisa envolveu minha mente: 
"É melhor não deixar que ele desobedeça ao seu rei."

Como se meu corpo não fosse meu. Senti minhas pernas se moverem com graça e leveza. Pois eu não sabia que horrores me aguardavam, se não parasse aquele ruído horrível.

Para derrotar aqueles que ousassem barrar seu caminho. Ouvi sua voz melíflua como raios de sol. Com braços abertos, saltei sobre minha presa, e o segurei, com o polegar em sua traqueia.

Seu coração batia em sincronia com o meu. Seus gritos abafados pelo zumbido em meus ouvidos. Como se o próprio senhor concordasse comigo...Vi suas vestes amarelas em suas lágrimas.

Ri ao senti-lo mole sob mim, eu vi o seu rosto; uma máscara de histórias narradas. Ao soltá-lo, minha mente finalmente em paz, procurar o livro tornou-se minha próxima tarefa.

Papéis espalhados onde meus punhos haviam se aberto. Costuras que, pelo tempo, haviam se desfeito. Páginas que viraram pó quando as agarrei. Pois eu não sabia para onde meu rei havia ido.

As últimas palavras que li me deixaram procurando. Buscando sua coroa dourada e seu xale. Meu cérebro ecoa com as vergonhas e maldições do rei, por não ter cumprido seu chamado final.

Por favor, se você está aí e está lendo, se sabe de algum lugar onde encontrar esta história,  livre-me das dores de minha súplica, ajude-me a trazer meu rei à sua glória total.

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