Estou escrevendo isso com as mãos tremendo, sem saber por onde ou como começar. Não sou de internet ou de posts, sou apenas um taxista que vive dia após dia, tentando sobreviver, porque ganhar a vida não é fácil. Mas o que aconteceu comigo... não sei como descrever. Algo mais estranho que ficção, mais aterrorizante que qualquer filme que já vi na vida. Estou contando isso aqui porque... sinceramente, não sei por quê. Talvez para alertar alguém, talvez para que alguém acredite em mim, talvez para aliviar um pouco minha consciência antes... antes de sei lá o que pode acontecer. Não vou dizer meu nome nem onde estou agora, porque estou com medo. Muito medo.
Tudo começou há alguns dias, talvez uma semana, talvez dez dias, o tempo está embaralhado para mim. Era uma noite comum, como tantas outras. Poucos clientes, calor, e você lutando para juntar dinheiro para a gasolina e o aluguel do carro. Eu estava parado em um ponto meio deserto, esperando qualquer corrida para quebrar o tédio. Já passava de uma da manhã. De repente, vi alguém acenando para mim de longe. Ele parecia meio estranho. Alto, magro, com roupas normais, mas que pareciam não ser dele, meio largas, e os olhos... os olhos dele eram assustadoramente vazios. Como se ele olhasse através de você, não para você.
Pensei: “Beleza, qualquer corrida serve.” Parei para ele. Ele abriu a porta do lado e sentou. Nem respondeu meu cumprimento. Ficou quieto por um momento, e esperei ele dizer para onde queria ir. Nada. Olhei pelo retrovisor e vi ele encarando o vazio, totalmente desligado.
Falei: “Senhor? Para onde?”
Ele me olhou lentamente, como se girar o pescoço exigisse um esforço enorme. A voz era baixa, estranha, como se não falasse há muito tempo: “Dirija.”
Fiquei surpreso. “Dirigir... dirigir para onde? Preciso de um destino, chefe.”
Os olhos dele voltaram a encarar o nada à frente. “Apenas dirija. Qualquer lugar.”
Pensei: “Esse cara parece estar chapado ou louco.” Mas, mesmo assim, dinheiro é dinheiro. Ele parecia que pagaria bem, talvez não fosse dali ou estivesse perdido. Decidi rodar um pouco com ele até ele se decidir, ou quem sabe estava esperando um telefonema ou algo assim.
Liguei o taxímetro e comecei a dirigir. Entrei em uma rua lateral tranquila. O carro seguia devagar, e o silêncio tomava conta. Estou acostumado com silêncio, mas com esse passageiro, o silêncio era pesado. Muito pesado. Parecia que havia uma montanha sentada ao meu lado, não um ser humano. De vez em quando, olhava pelo retrovisor e o via no mesmo estado, encarando o vazio, sem piscar, como uma estátua.
Depois de uns dez minutos, enquanto estávamos em outra rua lateral, um pouco mais estreita e iluminada, de repente vi ele levantar a mão direita lentamente e apontar para um homem que caminhava na calçada oposta. O homem parecia comum, talvez voltando do trabalho, com uma sacola na mão. O passageiro apontou para ele com o dedo indicador, sem dizer uma palavra.
E, de repente, o homem na calçada... caiu. Caiu de cara no chão, de uma vez, como um boneco. A sacola na mão dele estourou, e o conteúdo se espalhou pelo chão. Pisei no freio por puro choque. O carro parou com um tranco.
Olhei para o passageiro, sem acreditar: “O que foi isso? O cara caiu! Você viu?”
Ele estava completamente impassível. Não tirou os olhos do homem caído. Logo, vi pessoas se juntando ao redor do homem, e os gritos começaram. Alguém berrou: “Ambulância! Chamem uma ambulância!”
Meu coração batia como um tambor. Olhei para o passageiro de novo e vi ele abaixar a mão com a maior calma, voltando a olhar para a frente como se nada tivesse acontecido.
“Senhor... você conhece aquele homem?” perguntei, com a voz tremendo.
Ele não respondeu.
“Senhor! Estou falando com você...”
Ele me cortou com a mesma voz baixa e assustadora: “Dirija.”
Senti um frio percorrer meu corpo inteiro. Isso não era normal. O que havia de errado com esse homem? E que coincidência bizarra era essa? Ele aponta para alguém, e a pessoa cai? Não, isso não era coincidência. Minha mente se recusava a acreditar que havia uma conexão, mas meu instinto dizia que não, algo estava errado. Muito errado.
Pensei: “Calma, cara, talvez o homem estivesse doente, talvez tenha desmaiado, é coincidência.” Tentei me convencer com força. Pisei no acelerador e segui, com os olhos grudados no retrovisor, vendo o lugar onde o homem caiu e a multidão se formando.
Continuamos rodando em um silêncio ainda mais pesado. Dessa vez, eu não tirava os olhos dele pelo retrovisor. Observava cada movimento dele com medo. Ele permanecia completamente imóvel. Mais dez minutos, quinze minutos... não lembro. Entrei em uma avenida um pouco mais movimentada. Os carros se moviam lentamente, lado a lado.
De repente, ele fez o mesmo gesto novamente. Levantou a mão direita, mas dessa vez apontou para o motorista de um caminhão de transporte que dirigia ao nosso lado. O motorista era um cara jovem, com música alta, cantando junto. O passageiro apontou para ele.
Um segundo... dois... o caminhão ao nosso lado de repente desviou bruscamente para a direita, como se o motorista tivesse perdido a consciência, e bateu em um carro estacionado na rua. O barulho da batida foi ensurdecedor, e a avenida inteira parou.
Meu corpo inteiro tremeu. Olhei para o caminhão, vi a cabeça do motorista caída sobre o volante, imóvel. Pessoas começaram a gritar e correr em direção ao acidente.
Virei-me para o passageiro, sentindo o sangue sumir do meu rosto. “Você... o que você fez? O que está fazendo?!” Minha voz estava alta dessa vez, e eu não conseguia controlar.
Ele me olhou com a mesma frieza. Uma frieza mortal. E disse uma frase: “Ele escolheu.”
“Escolheu o quê? Do que você está falando?! Você tem algo a ver com isso?!”
Ele voltou a olhar para a frente. “Dirija.”
Dessa vez, eu estava realmente apavorado. Não era só ansiedade ou confusão. Era medo de verdade. Esse homem não era um ser humano normal. Havia algo demoníaco nele. Coincidência não se repete duas vezes do mesmo jeito. Ele aponta, e as pessoas caem ou sofrem acidentes terríveis. Não... não caem. Eu vi o primeiro homem, vi esse motorista. Eles pareciam mortos.
Pensei em abrir a porta, me jogar do carro e correr. Pensei em parar o carro, gritar, chamar a atenção das pessoas para ele. Mas o medo me paralisou. Medo do desconhecido. Medo dele. Se ele conseguia fazer isso com pessoas na rua com um gesto, o que faria comigo se eu desobedecesse?
Continuei dirigindo, com as mãos tremendo no volante. Não sabia para onde estava indo. Entrei em ruas que não reconhecia, perdido como um barco sem vela. E ele ali, sentado em silêncio. O silêncio dele agora tinha um som. Um som ameaçador. Um som que dizia que cada segundo passando com ele naquele carro me aproximava de um desastre.
Depois de um tempo, não sei quanto, talvez meia hora, talvez mais, estávamos em um bairro operário mal iluminado, com casas apertadas umas contra as outras. As ruas eram tão estreitas que mal cabia um carro. Havia uma senhora idosa caminhando sozinha na beira da rua, segurando uma bengala e se apoiando nela. Parecia tão frágil e pobre.
Meu coração apertou quando vi ele começar a levantar a mão novamente. Pensei: “Não! Ela também não! É uma velhinha pobre!”
Antes que ele pudesse apontar, antes que eu pudesse pensar no que fazer, gritei alto, olhando para ele pelo retrovisor: “Cuidado! Não faz isso! Não com essa mulher!”
A mão dele parou no ar por um instante. Ele me olhou de novo. Dessa vez, senti como se houvesse um brilho... não sei o quê... talvez surpresa? Talvez algo que eu não conseguia decifrar aqueles olhos vazios.
Ele perguntou, com aquela voz baixa que me aterrorizava: “Você tem medo por ela?”
“É uma velhinha pobre! Tenha piedade! Por que você está fazendo isso? Quem é você, afinal?!” Eu falava rápido, o medo dificultando formar frases coerentes.
Ele me olhou por mais um tempo. Depois, abaixou a mão lentamente. E voltou a olhar para a frente. “Dirija.”
Senti que voltava a respirar, embora com dificuldade. A senhora continuou seu caminho, alheia a tudo. Passamos por ela. Continuei dirigindo, mas dessa vez fiquei circulando pela mesma área, sem querer ir muito longe, como se tentasse evitar que ele encontrasse uma nova “presa”.
Rodei por mais uma hora, mais ou menos. Ele ficou em silêncio. E eu continuava olhando para ele e para a rua, com o coração na garganta. Até que me cansei, me esgotei, e meu medo chegou ao limite. Parei o carro de repente em um lugar escuro e vazio. Desliguei o motor. E virei o corpo inteiro para ele.
“Olha, não dou mais um passo até entender. Quem é você? O que está fazendo com essas pessoas? Qual é a sua história, exatamente?!”
Ele ficou em silêncio por alguns instantes, olhando para a frente. Senti que meu coração ia parar de tanta tensão. Então, ele me olhou. Mas dessa vez, o olhar era diferente. Como se uma parte da máscara que ele usava tivesse caído. Senti um olhar de... tristeza? Ou talvez cansaço? Não sei.
Ele disse, com uma calma estranha: “Eu vejo.”
“Vê o quê?!”
“Eu vejo o que eles fizeram. Vejo a marca neles.”
“Marca?! Que marca é essa?!” Comecei a sentir que minha cabeça ia explodir de tantas perguntas e tanto horror.
“Cada um de nós tem uma marca. Como um halo. A cor dele diz o que a pessoa fez na vida. Fez o bem ou fez o mal.”
As palavras não faziam sentido. Halos? Cores? Isso era coisa de louco!
“Do que você está falando? Tá louco?!”
“Não estou louco,” ele disse com a mesma calma. “Eu realmente vejo. Esse halo diz tudo. Há halos brancos, puros. São pessoas boas, pacíficas. E há halos cinzas, aqueles que pecaram e se arrependeram, ou que têm vidas meio a meio. E há... halos negros.”
Quando ele disse “negros”, senti a voz dele mudar. Havia um tom de... ódio? Ou talvez nojo.
Ele continuou: “Esses halos negros pertencem a pessoas que realmente fizeram mal aos outros. Pessoas que destruíram vidas. Pessoas que roubaram, mataram, oprimiram... pessoas que não merecem andar na terra entre os bons.”
Engoli em seco. “E aquelas pessoas que você apontou... os halos delas eram negros?”
Ele assentiu lentamente. “Os tons mais escuros de negro. Pessoas que fizeram coisas... que você não consegue imaginar.”
“E você... quando aponta para eles... o que acontece com eles?” Fiz a pergunta sabendo a resposta, mas precisando ouvir dele.
“O halo deles apaga. Como uma lâmpada que queima. E a alma deles deixa o corpo.”
Ele disse isso com tanta simplicidade, como se falasse do tempo. Senti o mundo girar ao meu redor. Esse homem... não era só alguém que via coisas estranhas. Ele estava julgando pessoas e executando a sentença. Um anjo da morte com pernas? Um demônio? Não sei. Mas o que eu sabia era que ele era perigoso. Muito perigoso.
“Então... e eu?” As palavras saíram sem querer. Não sei por que perguntei. Talvez curiosidade mórbida? Talvez terror?
Ele me olhou de novo. Dessa vez, os olhos dele ficaram fixos em mim por um tempo. Senti como se ele estivesse me atravessando com o olhar. Como se folheasse todas as páginas da minha vida passada. Senti um frio entrar nos meus ossos, apesar do calor lá fora.
“Você?” ele repetiu a palavra suavemente.
“É... eu. Que cor de halo você vê em mim?” perguntei, arrependendo-me de cada letra que pronunciei.
Um leve, mas aterrorizante, sorriso tocou os lábios dele pela primeira vez. Foi o sorriso mais feio que já vi na vida.
“Seu halo?” ele disse, inclinando-se levemente para mim, a voz baixando para um sussurro. “Seu halo... é mais negro que a noite. Mais negro que o próprio coração do diabo. Um dos piores halos que já vi na vida.”
Naquele instante, perdi o controle. Tudo o que lembro é abrir a porta do carro e me jogar para fora enquanto ele ainda estava parado. Corri. Corri o mais rápido que pude, sem olhar para trás. Sentia o olhar dele nas minhas costas, a voz dele ecoando nos meus ouvidos. “Mais negro que a noite...”
Continuei correndo até minhas pernas não aguentarem mais. Entrei em ruas e becos desconhecidos até me encontrar em um lugar muito distante. Peguei o transporte público que encontrei e fui para um lugar longe, onde ninguém me conhece. Deixei o carro, deixei tudo.
Agora estou sentado em um quarto de hotel barato, escrevendo isso. Por que ele disse isso sobre mim? Por que meu halo, especificamente, é tão negro?
Tem algo... algo que aconteceu há muito tempo. Muitos anos atrás. Eu ainda era um jovem inconsequente, precisando de dinheiro. Fiz algo... algo terrível. Algo de que me arrependo todos os dias da minha vida. Um crime... eu estive envolvido. Um sequestro... sequestramos uma menina. As coisas saíram do controle... e a menina... a menina morreu. E nós... eu e os outros comigo... nos livramos dela. Jogamos o corpo em um lugar onde ninguém nunca encontraria.
Ninguém sabe disso, exceto eu e os dois caras que estavam comigo. E nenhum deles vai falar. Vivi todos esses anos com esse segredo, com essa culpa. Tentando viver normalmente, tentando esquecer. Mas parece... parece que essa culpa deixa uma marca que não pode ser apagada. Uma marca que esse homem conseguiu ver.
Ele sabe. Aquele homem sabe o que eu fiz. E quando ele disse que meu halo era mais negro que a noite, não estava apenas me ameaçando. Estava me dizendo que minha vez estava chegando. Que ele ia limpar o mundo de mim também.
Não sei o que fazer. Me entregar? Será que acreditariam em mim se eu contasse sobre o homem dos halos? Me chamariam de louco. E se eu não contar... vou viver o resto da vida nesse terror? Esperando a qualquer momento encontrá-lo na minha frente, apontando o dedo... e meu halo apagando?
Por que escrevi tudo isso? Talvez para confessar. Talvez para que, se algo acontecer comigo, alguém saiba a verdade. A verdade sobre o que fiz naquela época e a verdade sobre esse homem aterrorizante que anda pelas nossas ruas, julgando pessoas.
Se algum de vocês vir um homem alto, magro, com olhos vazios, caminhando sozinho à noite... corra. Corra e não deixe ele se aproximar. E não deixe ele ver seu halo.
Não sei o que vou fazer agora. Continuar fugindo? Até quando? Ele pode me encontrar? Será que está me procurando agora, enquanto escrevo isso?
Meu Deus, me proteja. Estou com medo. Muito medo. Alguém me ajude... alguém me diga o que fazer? Sinto que meu fim está próximo. Sinto que ele vai me encontrar.
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