Nos dias seguintes ao casamento, havia uma espécie de domínio estranho que a tradição exercia sobre nós. O costume prevalecia sobre o bom senso, e a cultura superava a razão. Uma dessas tradições era que a noiva precisava ser levada para a vila do noivo à meia-noite — sempre à meia-noite. As pessoas diziam que era para proteger sua modéstia, para garantir que nenhum estranho visse seu rosto antes de ela se mudar para sua nova casa. Mas eu sempre achei que era uma questão de medo — superstição disfarçada de ritual. Ninguém questionava. Ninguém ousava.
Naquela noite, como em tantas outras antes de mim, eu era um dos homens chamados para escoltar a noiva. Não era seu irmão, mas era primo — próximo o suficiente pelo sangue para aceitar a honra e carregado o suficiente pela obrigação para não recusar. Dois de nós caminhavam atrás da carroça de bois, varas nas mãos, vigiando sob a luz da lua. A carroça rangia como um osso velho a cada giro da roda. A noiva estava escondida lá dentro, envolta em silêncio, coberta por camadas de tecido e tradição.
A vila ficava a horas dali, e a estrada serpenteava por campos vazios e florestas densas e sussurrantes. O ar estava frio, mas havia uma quietude que até os insetos pareciam relutar em romper. Tudo o que se ouvia era o leve estalar de nossos passos no chão, o suspiro dos bois e, ocasionalmente, o pio fantasmagórico de uma coruja ao longe.
Enquanto passávamos por um pequeno lago — uma superfície escura de água parada sob as estrelas —, vi algo se movendo em sua margem. Olhei para a escuridão. Parecia uma raposa, magra e pequena, com o focinho tremendo enquanto fuçava o lixo deixado por viajantes. Talvez fossem seus movimentos selvagens que chamaram minha atenção. Talvez fosse o modo como ela me encarou quando percebeu que eu a observava.
Meio em tom de brincadeira, eu disse: “Por que ficar aí quando pode vir conosco? Temos o suficiente para te alimentar por dias na nossa vila.” Ri baixinho para mim mesmo. Meu companheiro me lançou um olhar de soslaio, mas ficou em silêncio. Naquele momento, senti um orgulho estranho da minha piada, como se tivesse dito algo espirituoso para a escuridão.
Seguimos adiante.
Mas a noite não esqueceu.
Uns dez minutos depois, ouvi um ruído muito leve atrás de nós — um arrastar ou um passo hesitante. Virei-me, e lá estava. A raposa. Só que... não era exatamente a mesma. Estava maior agora, com o pelo molhado ou talvez faltando em algumas partes. Ela nos seguia à distância, mantendo-se apenas no limite da visão na escuridão.
Ri nervosamente e bati minha vara no chão. “Xô! Vai comer em outro lugar”, disse, tentando soar mais corajoso do que me sentia. A criatura hesitou, inclinou a cabeça — mas não fugiu.
Meu primo se virou e também a viu. “Raposas não seguem pessoas assim”, ele reclamou.
“Talvez esteja doente”, respondi. “Não acredito nisso.”
Continuei olhando para trás mais do que para onde estava indo. A criatura nos seguia, firme e lenta, como se estivesse de algum modo ligada a nós. Cada vez que eu olhava para ela, parecia menos uma raposa. Seu andar era antinatural — suave demais, silencioso demais. Seus olhos haviam perdido aquele brilho animal e agora apenas refletiam... nada. Sem medo. Sem curiosidade. Nada.
Então veio o momento que mudou tudo.
Virei-me mais uma vez, e o que vi me paralisou no lugar.
Não era uma raposa. Não era nem mesmo um animal. Estava sobre quatro patas, mas seu corpo era nu — liso e alongado. Buracos pontilhavam sua pele, como se a decomposição tivesse começado anos atrás, mas ainda assim se movia com propósito. Tinha o tamanho de um bezerro, contorcido e curvo na forma, mas assustadoramente vivo. Olhava para mim como se tivesse ouvido a piada que contei e aceitado o convite.
Fiquei parado ali. Meu coração batia tão rápido que temi acordar a noiva. Meu primo se inclinou e sussurrou: “O que... o que é isso?”, mas eu não consegui responder.
Eu sabia — no fundo dos meus ossos — que não podíamos levar aquilo para a vila.
Então fiz o melhor que consegui pensar. Aproximei-me lentamente a pé, tremendo a cada passo. Coloquei minha vara à minha frente como um sinal de rendição e me ajoelhei.
“Por favor”, sussurrei. “Fiz algo errado. Não há nada para você onde estamos indo. Fiz uma promessa falsa. Não nos siga, por favor.”
A criatura não se moveu. Encarou-me, com olhos vazios que não piscavam. Por um momento, achei que ela estava prestes a atacar. Mas então, com um leve movimento de sua cabeça estranha — ou talvez um ajuste de seu corpo estranho —, ela se virou para o oeste e foi embora. Sem ruído. Sem sinal. Silenciosa e sumida.
Desapareceu na escuridão, engolida pela noite.
Fiquei ali parado pelo que pareceu uma eternidade antes de conseguir andar novamente. Meu primo e eu não trocamos uma palavra enquanto caminhávamos. Nem mesmo olhamos para ver se a criatura voltaria. Não nos importávamos.
Uma semana depois, chegaram notícias do oeste.
Vila após vila — doentes. Pessoas morrendo aos montes. Alguns diziam que era malária. Outros, que era uma maldição. Lembrei-me dos buracos na pele daquela criatura, do modo como ela caminhava, do silêncio que carregava consigo. Lembrei-me do que eu disse, do que eu convidei.
“Fui eu?”, continuava me perguntando, repetidamente. “Eu desencadeei algo?”
A vergonha grudou em mim como poeira, pesada e sufocante. Jejuei por dias. Não conseguia dormir sem ver seu rosto — ou o que equivalia a um. Cada noite, eu me pegava olhando para o oeste, meio que esperando ver sua forma surgir no horizonte, voltando para reivindicar o resto do que eu havia prometido.
Anos se passaram, mas a sensação nunca desapareceu. A noiva e o noivo seguiram com suas vidas, e outras pessoas logo esqueceram aquela noite. Mas eu não. Eu não podia. Certos erros diminuem com o passar do tempo, mas alguns lançam uma sombra. Eu ri na escuridão, e algo escutou. Algo que não riu.
E agora, mesmo anos depois, eu me pego pensando. Era aquela coisa o portador da doença? Um fantasma? Um demônio? Ou seria algo criado pela culpa, nascido de uma coincidência tão terrível que não podia ser ignorada? Não sei. Tudo o que sei é isso: alguns convites não devem ser feitos. E, se forem, não podem mais ser desfeitos.
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